Manuel Matola (texto) e António Silva (fotos)
O pintor angolano Lino Damião diz que não gosta de “falar de política” senão por via de pintura, pelo que é nos dois únicos quadros que exibe na exposição “Fala Só” patente na Galeria de Artistas Plásticos de Angola, em Lisboa, onde o curador critica publicamente aquele país lusófono cuja diáspora terá pela primeira vez o direito de voto.
“Os meus quadros têm um bocado disso: de Política, da Cultura e Educação que se deve fazer em Angola. Têm uma crítica social”, diz Lino Damião ao dar respostas breves às perguntas do jornal É@GORA.
“O tema da exposição já diz tudo: Fala só. É para expressarmos livremente tudo que nos apetece”, diz Lino Damião numa das salas no primeiro andar da Galeria Artistas Angolanos onde, desde sábado até ao próximo dia 08 de maio, estão expostos quase duas dezenas de quadros de criadores angolanos.
É enquanto imigrante há mais de uma década em Portugal que o curador da exposição lança um olhar atento ao presente e futuro de Angola, por acreditar que no seu país de origem “tem de haver mudanças”, sobretudo a nível “da vida social”.
“Até na água, luz, o básico. O essencial. Logo, mudar os atores políticos. Não digo todos. Não sei, não vivo lá, não acompanho com frequência [a situação do país], mas para haver essa qualidade de vida é preciso ter pessoas certas nos lugares certos. Não é fácil em qualquer parte do mundo. Então imagina em Angola”, compara, propondo como solução a tomada de uma posição firme que visa o cumprimento de um dever cívico.
“Por isso que devemos votar. É um dever”, diz Lino Damião que aos 45 anos de idade só votou uma vez em 20 anos de paz em Angola e garante votar pela primeira vez, mas a partir de Portugal onde reside há 12 anos, nas próximas eleições gerais extensivas aos imigrantes.
Numa das duas fotos expostas – porque a terceira “foi censurada” e o artista acatou a decisão por “conselho dos mais velhos” -, Don Ruelas refaz as mensagens que retirou dos vários jornais da Angola contemporânea e junta-as num retrato único “para exprimir” a sua visão em relação a Luanda, a moderna capital angolana onde existem hoje diferentes edifícios que foram erguidos sem que o cidadão comum saiba como é que eles surgem.
“Temos cá [na foto] diferentes edifícios que foram erguidos na cidade de Luanda em que no meu olhar e de muitos nunca foi justificado como é que eles surgem. E eu através de recortes dos jornais fiz a minha junção para exprimir a minha visão daquilo que é supostamente a facilidade de construir estes edifícios”, diz defronte do quadro intitulado “Vista em Linha” onde o artista utiliza técnica mista sobre papel.
“Eu uso a fotografia como base e depois vou acrescentando outros elementos à fotografia que é para poder ter uma informação mais completa”, explica o artista plástico angolano em conversa com o jornal É@GORA, a quem esclarece a opção.
“É também para facilitar um pouco mais àqueles que veem visitar os meus trabalhos. Procuro informá-los o melhor possível”, diz.
Censura
Quando confrontando se a sua decisão não colide com o ditado que advoga que uma imagem vale mais do que mil palavras, Don Ruelas rapidamente contrapõe: “Eu aprendi que quando se acrescenta o texto à imagem fixa não textual essa junção reforça a informação, ou seja, fica mais composta. É certo que uma imagem vale mais do que mil palavras, mas muitas vezes é para se fazer entender – porque nem todos têm a leitura visual e conseguem descodificar a informação”, riposta.
E acrescenta: “Na verdade estas palavras que exprimo neste trabalho artístico é fruto de recortes de informações que surgiram nos jornais. O que fiz foi recortar essas informações e trazer uma nova informação. Estas palavras têm muito a ver com a imagem em si”.
Uma imagem que, de resto, pretende que retrate parte do que acontece(u) nos últimos 46 anos de independência da nação lusófona cujo processo histórico se resume em três fases: 30 anos de guerra civil entre o governo e a UNITA, 20 anos do calar das armas ao lado da crescente corrupção que leva a que Angola hoje ainda seja “um país com grandes desafios por superar”.
Do rol das dificuldades do país africano estão “a necessidade de uma verdadeira reconciliação, compreensão entre nós os angolanos, em aceitarmos as diferenças e as críticas para podermos melhorar porque não somos muito distantes de um país perfeito, nem um povo perfeito. Se calhar [somos)perfeito à nossa, mas devemos também ultrapassar as dificuldades que temos atualmente para projetarmos um país futuro. E só se projeta um país futuro quando a sociedade no geral está envolvida, ou a valorização da cultura do povo fala acima de tudo e damos esse tal espaço que é para os fazedores de arte e conhecimento poderem servir o país. Então, o grande desafio que temos é a verdadeira reconciliação (para construir um país) onde exista o amor e paz para todos nós os angolanos”, enumera Don Ruelas.
Reconciliação que o próprio artista futuramente terá que fazer consigo próprio quando tiver que ultrapassar o desconforto da experiência de ver excluída uma das obras numa exposição onde apesar da palavra de ordem “Fala Só” há “falta de verdadeira liberdade de expressão”, que o impediram de apresentar aquilo que tinha para “mostrar ao mundo”.
“Neste momento tenho dois quadros expostos. Supostamente poderiam ter sido três, mas em função daquilo que eu posso até dizer que é censura, ou a falta de verdadeira liberdade de expressão, aceitação e respeito por aquilo que o artista produz. Ainda acho que a experiência que cá estou a viver não seja das melhores. Há uma obra de arte minha que foi censurada, não é possível ser apresentada aqui ao público em função de políticas favoráveis”, denuncia.
O artista revelou o teor da mensagem estampada no quadro que não expõe, quando questionado sobre o tema da tal obra.
“Em situações normais nos meus trabalhos eu faço críticas sociais. E nesse meu trabalho faço uma crítica social à nossa forma de estar, à governação e identificação dos tais problemas que aos olhos e ouvidos de muitos não soa bem mas que não deixa de ser uma tal realidade em que deve ser vista e ouvida e digerida de maneira que eleve o conhecimento dos nossos povos, porque é preciso, é necessário que as verdades também sejam ditas e apresentadas, identificadas. Não podemos continuar a esconder ou a obstruir os trabalhos que não sejam corretamente bem vistos ou ditos”, afirma Don Ruela.
“Independentemente da realização das eleições em Angola, considero esta iniciativa como muito boa. É um local que serve e servirá para divulgação da cultura angolana para projeção dos nossos artistas e que incentivo que as pessoas visitem, participem e que se possa também dar como forma de incentivo aos nossos artistas para divulgação da cultura angolana e africana em Portugal”, diz a diplomata. (MM)
Immigrants are depressed they pay taxes government do not provide them documents, kindly ask to SEF. More than 2 years without identity, how it feels.