Manuel Matola
A imigrante Maura N. recebeu uma conta de telefone fixo no valor de 500 euros ao tentar ligar inúmeras vezes, sem sucesso, para o SEF. Hoje não sabe como reverter a dívida que aparece na fatura.
O ordenado mínimo nacional é de 760 euros. Em 2024, o governo português vai acrescer mais 60 euros face aos atuais, para 820 euros.
Mas há imigrantes que “pagam 400 euros” a advogados, dos poucos que conseguem ser atendidos pelo SEF, alerta Patrícia B., também imigrante que está há dois anos a tentar fazer reagrupamento familiar do seu filho.
“Não consigo”, diz a brasileira sobre um processo que está a criar um misto de sentimentos na comunidade imigrante em Portugal.
As ligações telefónicas para o SEF quase nunca são bem sucedidas, pois sempre caem direto no som instrumental que se ouve como aviso de chamada em espera. Mas as chamadas são contabilizadas.
Os imigrantes insistem porque há quase uma semana da extinção do SEF continuam escassas as informações sobre o futuro do atendimento dos imigrantes uma vez que tudo “continua ainda no segredo dos Deuses” mesmo para os próprios funcionários.
O presidente do sindicato dos funcionários do SEF, Artur Girão, citado pela TSF diz, por exemplo, que até hoje a nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) “não tem” sequer “estatutos nem sede” quando falta aproximadamente uma semana para entrar em funções.
Segundo a TSF, a ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, garantiu que o documento está praticamente concluído e que até ao início da desta semana vai ser será dado a conhecer aos sindicatos do órgão.
Comentando, o presidente do sindicato dos funcionários do SEF, afirma que compreende os argumentos da ministra, mas não esconde alguma inquietação em declarações ao TSF.
“A senhora ministra assumiu que o governo se atrasou um pouco, mas reiterou que, em função da própria complexidade da fusão destas duas entidades, com as competências tão abrangentes que a Agência vai assumir, que o trabalho revelou ser um pouco mais complicado, lamentou esta situação, mas comprometeu-se que já no início da semana o documento será conhecido por todos”, explica, confessando que “ficam mais descansados”, mas mantêm “as mesmas questões”, escreve a rádio portuguesa.
O fim do SEF e a entrada em funções da nova agência estão marcados para dia 29 de outubro e as competências deste serviço de segurança vão ser transferidas para sete organismos, incluindo o Instituto dos Registo e Notariado (IRN).
Para já sabe-se que a Polícia Judiciária vai ficar no imediato com 390 inspetores do SEF, tendo em conta que 404 vão ficar afetos temporariamente à PSP e GNR para o controlo das fronteiras aéreas e marítimas, segundo a agência Lusa que explica está sexta-feira a divisão de tarefas.
“A GNR ficará responsável por vigiar, fiscalizar e controlar as fronteiras marítimas e terrestres, incluindo terminais de cruzeiro. A PSP integrará as competências de vigiar, fiscalizar e controlar as fronteiras aeroportuárias, bem como pela gestão dos centros de instalação temporária integrados nos aeroportos, quanto a PJ fica com a competência reservada na investigação da imigração ilegal e tráfico de pessoas”, escreve a agência de notícias portuguesa assinalando que a AIMA vai herdar do SEF “cerca de 300 mil processos pendentes de legalização de imigrantes”
E mais: a nova agência vai ficar também com as competências do Alto Comissariado para as Migrações quanto às questões do acolhimento e integração dos imigrantes.
No entanto, o Sindicato dos Trabalhadores dos Registos e do Notariado (STRN) alertou há dias que a transferência de competências do SEF para o Instituto dos Registo e Notariado (IRN) implicará “degradação e perda de qualidade dos serviços”.
Em comunicado, o STRN adverte ainda que com esta transferência de competências “agravar-se-ão igualmente os atrasos no setor dos registos, que se encontram já num estado caótico”.
“A esta hora, inexplicavelmente, tudo continua ainda no segredo dos Deuses. E os problemas que se vierem a detetar por causa desta transferência de competências serão, exclusivamente, da responsabilidade do Governo”, criticava o STRN em nota citada pela Lusa, na qual dizia temer que as informações sobre as mudanças em causa “sejam apenas conhecidas pelos trabalhadores nas `vésperas´, como tem sido hábito na forma como o Ministério da Justiça (MJ) trata deste tipo de assuntos”.
Está previsto que 59 trabalhadores do SEF sejam transferidos para o IRN, que passa a assegurar as competências na concessão e emissão do passaporte eletrónico português e o atendimento das renovações de autorizações de residência, diz a Lusa.
Em resposta aos problemas que dizem antever, o STRN defende que “Portugal deve ter uma política de imigração centrada nas pessoas de modo a promover a inclusão dos estrangeiros residentes em Portugal, na comunidade nacional, com garantia dos seus direitos plenos”.
“Deve ainda o Estado e a administração pública humanizar-se e formar-se condignamente vocacionando e dotando os serviços de meios para um atendimento que respeite a dignidade de todos e de cada um”, propõe também o STRN, argumentando ainda que “a reforma efetuada devia garantir soluções para os cidadãos migrantes, nomeadamente quanto ao tempo de espera para a obtenção de documentos”.
O alerta para problemas na transferência de competências do SEF também foi feito pelo antigo diretor do SEF Daniel Sanches que considerou na última sexta-feira “radical” e sem “vantagem efetiva” a extinção deste serviço de segurança, dizendo que a solução encontrada pelo Governo não faz sentido e destrói competências que levaram muitos anos a construir.
Para Daniel Sanches, “esta extinção foi de tal maneira radical que Deus queira que corra bem. Faço votos para que assim o seja, mas tenho algumas dúvidas, vai demorar conseguir os ritmos necessários para se conseguir o nível de eficácia semelhante ao que existia”, desabafou.
Até lá, a imigrante Maura N. continua à procura de uma resposta para reaver os seus 500 euros da dívida que contraiu à operadora de telefonia móvel.
À primeira teve uma explicação de outra imigrante, Laís Safira, que também fez inúmeras tentativas para o SEF, chegou-lhe uma conta de 100 euros e teve mesmo que pagar.
No entanto, Maura N. mantém a esperança, até porque, garante, “vi(u) que algumas pessoas passaram pelo mesmo e conseguiram o cancelamento”, pelo que exorta: “Quem passou por isso, por favor, me diz o que fizeram”.
As respostas que obtém de seguida são contraditórias, típicas dos grupos de redes sociais onde as informações são a verdade de quem o diz em função da experiência pessoal de cada imigrante. (MM)