As prioridades de José Maria Neves para a diáspora da “Nação global”

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FOTO: LUSA ©

Manuel Matola

O novo Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, considera “fundamental” à criação de oportunidades para os jovens que também residem na diáspora, de modo a “conectá-los com o país” numa “nova lógica” e um “novo quadro mental” que permita que Cabo Verde funcione em rede.

A ideia é que haja um “constante aproveitamento e rentabilização” daquilo que Cabo Verde “é e tem” enquanto “Nação global”, disse no seu discurso de posse como o quinto Presidente eleito desde a introdução do bipartidarismo em 1991.

Apontando as linhas orientadoras da sua presidência, em português e crioulo, José Maria Neves defendeu hoje a construção de “uma relação mais eficaz e mais enriquecedora” entre Cabo Verde e “a sua imensa Diáspora” composta por diferentes gerações de cabo-verdianos que dentro e fora do país podem “fazer grande” e podem “ir longe, muito longe”.

Olhando para a “Nação global” que representa aquele país africano, o novo chefe de Estado cabo-verdiano destacou a França e os Estados Unidos como dois polos mundiais onde os cidadãos oriundos de Cabo Verde “vão trilhando caminhos de sucesso” e demonstrando a “sua capacidade de espoletar processos de transformação e modernização do arquipélago”.

Primeiro apelou para a confirmação da empresária de origem cabo-verdiana Elisabeth Moreno ao que ia dizer: “A Senhora Ministra da Igualdade da República Francês, hoje aqui presente, é testemunho vivo do quanto os filhos da nossa Diáspora vão trilhando caminhos de sucesso e de um palpitante tributo de orgulho aos nossos antepassados que desde muito cedo emigraram, com suor e sacrifício, para os mais diferentes países do mundo”, apontou.

A seguir, no mesmo sentido, pediu auxílio de Martin Walsh: “O Senhor Secretário do Trabalho dos Estados Unidos, antigo Mayor de Boston, Cidade que acolhe uma das maiores e mais antigas comunidades cabo-verdianas espalhadas pelo mundo, é também testemunha da extraordinária pujança da Diáspora cabo-verdiana naquele país. Do seu espírito criativo e empreendedor. Da sua capacidade de espoletar processos de transformação e modernização do arquipélago”.

Em outubro, José Maria Neves, de 61 anos, foi eleito com 51,7% dos votos, sucedendo no cargo a Jorge Carlos Fonseca, que terminou o segundo e último mandato como Presidente da República de Cabo Verde.

E num diagnóstico à ação de Cabo Verde no plano externo, José Maria Neves propôs que o país continue a pautar por “uma política realista, pragmática e inteligente”, lembrando que a “Nação global” vive uma situação de crise, a qual “ficou revelada e agravada” pela pandemia da Covid-19 com efeitos que “têm sido extensos e profundos, designadamente nos planos social, económico e emocional”.

Uma situação que, segundo considerou o novo chefe de Estado do arquipélago, faz com que também “a grande prioridade nacional” tenha de ser, “necessariamente, a reconstrução do país neste ciclo doloroso do pós-pandemia”.

De resto, “trata-se de uma tarefa ingente e que exige a convocação de toda a Nação Global cabo-verdiana”, considera.

José Maria Neves, que nos últimos cinco anos foi também imigrante em Portugal, enquanto se preparava a título pessoal para assumir a presidência do país, teve uma noção mais real das necessidades da diáspora especialmente no território português, que é o que acolhe a maior comunidade cabo-verdiana no mundo.

Foi na base desta experiência que o novo chefe de Estado terá igualmente percebido que “Cabo Verde tem de construir uma relação mais eficaz e mais enriquecedora com a sua imensa Diáspora”.

“Temos de fechar o ciclo das remessas financeiras e investimentos circunscritos, e abrir um outro que, mais do que isso, aposte em capitais e ativos valiosos nos nossos dias. Falo de remessas de ideias, remessas espirituais, remessas de competências e capacidades, dentre as muitas e altamente qualificadas que existem nas nossas comunidades emigradas”, aponta.

E justifica: “Trata-se de um contributo auspicioso para, por exemplo, acelerarmos passo em domínios que garantam o futuro da Nação e melhorarmos a capacidade de resposta da Administração Pública, sobretudo em valências carentes de um verdadeiro choque tecnológico e de parâmetros elevados de qualidade. Tal o caso da Saúde ou os casos da Educação, Ciência e Inovação. Tal também o caso da Transição Digital. Temos já suficiente capacidade e experiência acumulada para almejarmos ser uma plataforma das Tecnologias Informacionais em África. Mas igualmente no domínio das Energias Renováveis e da Eficiência Energética ou no da Economia Azul. Temos de ousar e temos de agir mais depressa”.

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Reconhecendo Cabo Verde “como país pequeno e fortemente exposto ao que ocorre no mundo”, para José Maria Neves os cabo-verdianos têm que apelar para sua “inteligência adaptativa” que “tem de ser servida por uma bem informada capacidade de leitura, projeção e identificação das mudanças e dos desafios que emergem todos os dias e dão conta da enorme transmutação que caracteriza a sociedade internacional dos nossos tempos”.

Mais vê uma saída: “Tenho, por conseguinte, uma enorme confiança nos nossos Profissionais das Relações Internacionais e da Diplomacia, domínio este que, aliás, deu sempre um contributo inestimável para a afirmação externa, o respeito e o prestígio de Cabo Verde na arena internacional”.

No entanto, para tal, “impõe-se uma aposta renovada no multilateralismo, na legalidade internacional, na busca de soluções negociadas para os diferendos, na paz e estabilidade como valores e balizas para a comunidade internacional”.

Nisso há que escolher: “A África tem de merecer toda a prioridade enquanto o continente a que pertencemos, sendo assim o espaço natural e de ancoragem de toda e qualquer estratégia de valorização e projeção das nossas vantagens comparativas, transformando-as em fontes de vantagens competitivas”.

Igualmente, diz: “Temos de acelerar o passo na frente da integração regional e da inserção nas dinâmicas continentais, no plano económico e não só, sempre defendendo as nossas especificidades e necessidades particulares enquanto pequeno Estado arquipelágico e no meio do Atlântico, neste corredor que é tanto de oportunidades quanto de ameaças de cariz global”.

Segundo José Maria Neves, “o Presidente da República garante todo o respaldo a uma crescente presença e participação na CEDEAO e nas instâncias e iniciativas da União Africana e outras instituições de âmbito continental”, pelo que “na mesma senda, impõe-se uma política muito forte de grande vizinhança”.

Uma política que, refere, considere tanto a comunidade regional – CEDEAO -, quanto “os Estados que a integram”, designadamente, a Mauritânia, Marrocos, Angola e África do Sul, bem como, a Oeste e a Sul, os Estados Unidos, o Brasil e o Mercosul.

“A nossa Parceria Especial com a União Europeia tem ainda enormes margens de crescimento e deve continuar a afirmar-se como instrumento valioso para o desenvolvimento e a competitividade de Cabo Verde. A redinamização da Conferência dos Arquipélagos da Macaronésia (Açores, Cabo Verde, Canárias e Madeira) é essencial para a estratégia de alargamento e reforço da Parceria Especial Cabo Verde – União Europeia”, defende.

E apresenta uma garantia: “Estarei empenhado no reforço dos especiais laços e das relações bilaterais com os países amigos e parceiros tradicionais de Cabo Verde, alguns deles hoje representados ao mais alto nível”.

E, no quadro de um trabalho estratégico com o Governo do dia, José Maria Neves assegura ter “uma forte ação” junto de países asiáticos e dos países do Golfo Pérsico.

E em prol também da diáspora, sobretudo, em Portugal, pretende apostar na lusofonia.

“De entre as organizações a que pertencemos, merecerá a minha máxima atenção e acarinhamento a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, CPLP, estimulando uma nossa cada vez mais qualificada participação e o aprofundamento dos ganhos já alcançados, designadamente em domínios tão sensíveis como é o da mobilidade. Mobilidade de pessoas, mas também mobilidade de bens, em especial dos bens culturais e do conhecimento”, frisa na lista das prioridades para os próximos cinco anos. (MM)

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