Brasileiros estão “sedentos de espaços para participação política” em Portugal, diz deputada

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A presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Renata Souza, considerou que os brasileiros “estão muito sedentos de espaços para participação política” em Portugal, onde já representam maior comunidade estrangeira.

Em declarações ao jornal É@GORA, Renata Souza, que em 2018 foi eleita deputada estadual do Partido Socialismo e Liberdade (Psol), sendo a mais votada entre as forças políticas de Esquerda em todo o estado de Rio de Janeiro, considerou que era “fundamental” criar-se esses mecanismos de integração, até porque, aquando da sua recente passagem por Portugal, constatou que “os brasileiros estão muito sedentos de espaços de participação política”.

Durante a sua estadia em Portugal, Renata Souza integrou um painel que debateu a participação das “Mulheres negras na política em Portugal” e encontrou-se com a comunidade brasileira na Casa do Brasil em Lisboa, cuja presidente, Cyntia de Paula, também defendeu recentemente, num outro fórum, “a própria falta de mecanismos de participação (de imigrantes) nos partidos políticos” portugueses.

Falando ao jornal É@GORA, Renata Souza destacou a importância de, especialmente, as mulheres da comunidade brasileira em Portugal ouvirem mulheres que estão na política em Portugal, até porque são as “que têm uma agenda feminista contra as desigualdades sociais”.

“Então é muito importante para que os brasileiros também conheçam essas mulheres negras que estão à frente da política aqui em Portugal”, nomeadamente Joacine Katar Moreira e Beatriz Gomes Dias, exemplificou Renata Souza, que é a primeira mulher negra deputada a presidir a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.


Presidente da Casa do Brasil defende quotas para imigrantes

Intervindo recentemente na apresentação do Relatório sobre Racismo, Xenofobia e Discriminação na Assembleia da República, a presidente da Casa de Brasil em Lisboa questionou a falta de inclusão de imigrantes enquanto atores primários “nos lugares de decisão” dentro do sistema de políticas públicas.

“Sinto, sobretudo, que mesmo quando somos utilizados é para questão de tokenismo”, ou seja, o esforço simbólico que, geralmente, se destina a criar uma aparência de inclusão e desviar acusações de discriminação, disse Cyntia de Paula.

“Deveríamos questionar por que as comunidades migrantes, aquelas poucas que têm esse espaço, não participam. Sobretudo, é muito importante olhar de várias formas e questionar a falta de informação acerca de direitos políticos“, afirmou Cyntia de Paula, que diz ser defensora do sistema de quotas para que os imigrantes e comunidades ciganas participem na política em Portugal.

Citando o Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2018, Cyntia de Paula lembrou que, no último ano, a comunidade brasileira em Portugal teve um aumento de 20 mil pessoas se comparado a 2017.

“Não acredito que sem quotas vão olhar para nós e achar que a nossa participação vai ser igualitária. Os mecanismos são necessários para que possamos ocupar os espaços de fala e estarmos nos lugares de decisão”, declarou aquela dirigente associativa.

Para a presidente da Casa do Brasil em Lisboa, é preciso uma troca de informações entre o poder público e, principalmente, políticas públicas de imigração mais ativas, bem como empoderamento nos espaços de decisão.

“Estamos a falar sobre a participação política, mas se olharmos os órgãos em que não é preciso ter reciprocidades para ocuparmos os cargos políticos, percebemos que não estamos incluídos nem sequer na participação de políticas de imigração”, reclamou.

Cyntia de Paula declarou que além de ser fundamental que se crie mecanismos de participação, sobretudo, “é preciso refletir o sistema de participação política dos imigrantes”.

“Quantas pessoas imigrantes, afrodescendentes, ciganas, ocupam lugares de decisão na União Europeia?”, indagou a representante da Casa do Brasil em Lisboa, sugerindo que o próximo relatório questione se, de facto, pretende criar mecanismos de participação e até que ponto tem criado medidas para que essa participação seja garantida.

Dados do Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2018 (SEFSTAT) revelam que o número de mulheres brasileiras imigrantes em Portugal equivalente a 60%, de um universo de 62.575 mulheres registradas, entretanto, elas são submetidas também a uma enorme situação de vulnerabilidade.

Para Cyntia de Paula, muitas imigrantes provenientes do Brasil desconhecem seus direitos por estarem em situação ilegal no país, o que, colocando-as numa “situação de vulnerabilidade, as mulheres permanecem em empregos onde são vítimas de assédio moral, pois têm medo de denunciar”, afirmou Cyntia de Paula.

“Numa perspetiva de género, tendo em conta o facto de a comunidade brasileira ser a maior, também somos a maior em número de mulheres, em torno de 60%. É fundamental pensarmos como as discriminações de género somam aos estereótipos associados às mulheres migrantes brasileiras”, referiu.

De acordo com Cyntia de Paula, há um simbolismo construído na comunidade portuguesa que evidencia “a ideia da hipersexualização e erotização das mulheres brasileiras”.

“Quando as mulheres saem em busca de uma oportunidade, encontram entraves baseados nessa questão de género”, sublinha a dirigente da Casa do Brasil, que também apela para que o debate político incida sobre as questões ligadas à discriminação e xenofobia contra a comunidade brasileira.

A responsável citou como exemplo a dificuldade das pessoas migrantes no que concerne à desinformação relacionada aos direitos de acesso aos serviços públicos na área de saúde.

“Existe um acordo entre Brasil e Portugal, temos um documento, o PB4, que nos permite ter acesso ao sistema de saúde, mas é recorrente mesmo como esse mecanismo, que permite acesso à saúde, o acesso é negado. É negado esse direito”, afirmou Cyntia de Paula.

Desde a introdução da democracia, após 25 de abril, Portugal já teve deputados oriundos de Países Africanos de Língua Portuguesa, ex-colónias portuguesas: em 1995, o Partido Socialista elegeu Celeste Correia, natural de Cabo-Verde, e o guineense Fernando Ká, enquanto o cabo-verdiano Manuel Correia foi eleito pelo Partido Comunista Português.

Atualmente duas candidatas de origem africana concorrem ao cargo de deputados no Parlamento português: a luso-guineense Joacine Katar Moreira, cabeça de lista do partido Livre, e a portuguesa nascida no Senegal, Beatriz Gomes Dias, fundadora e presidente da Associação de Afrodescendentes em Portugal, que ocupará a terceira posição na lista de candidatos a deputados às legislativas de outubro pelo Bloco de Esquerda às legislativas-2019.

Há mais de 10 anos que o angolano Hélder Amaral, do CDS-PP, continua a ser o único deputado em Portugal que quebra a falta de representatividade étnico-racial naquele órgão legislativo composto por 230 parlamentares. (X)

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