Caso Joacine: Rui Tavares critica atitude dos “elementos mais reacionários da sociedade portuguesa”

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O fundador do partido LIVRE, Rui Tavares, criticou a forma como “elementos mais reacionários da sociedade portuguesa” reagiram à eleição ao Parlamento português da afrodescendente Joacine Katar Moreira, alvo de “chuva de insultos e ofensas”, mas garantiu que “daqui para a frente”, na sociedade portuguesa, haverá uma forte união contra o fascismo e racismo.

“A solidariedade anti-fascista e anti-racista é o que nos une a todos e que vai que nos unir ainda mais daqui para a frente” – afirmou Rui Tavares, que esta segunda-feira participou, a título pessoal, numa manifestação frente à Assembleia da República, em apoio às três deputadas negras eleitas tanto pelo Partido Socialista, como pelo Bloco de Esquerda e o LIVRE, e que serão empossadas esta semana no arranque do novo mandato parlamentar em Portugal.

Interrompido por palavras de ordem “Não passarão…”, Rui Tavares viria a criticar a forma como «elementos mais reacionários da sociedade portuguesa» receberam a eleição da Joacine Moreira “com uma chuva de insultos e ofensas que a muitos não surpreendeu”.

E face a tal atitude, este gesto de solidariedade, como indicou, também poderá estender-se amanhã em nome de outras duas deputadas negras, respetivamente Beatriz Gomes Dias (BE) e Romualda Fernandes (PS) ou com qualquer outro cidadão dentro ou fora da Assembleia da República.


É preciso “dar voz a todos”

O dirigente do LIVRE, partido que viu eleger Joacine Moreira a deputada nas eleições legislativas do passado dia 06 de outubro, foi uma das presenças na concentração de segunda-feira. O fundador daquela força política aplaudiu a solidariedade dos coletivos anti-racistas e anti-fascistas, entre outros, para com Joacine Katar Moreira e as causas que a deputada eleita defendeu nestas eleições e que protagonizará mais ainda na Assembleia da República.

Na sua intervenção, a título pessoal, Rui Tavares referiu-se igualmente à agenda contra a ciganofobia, “o conceito mais escondido e mais difícil de combater”. Disse ainda que este tem que ser um combate futuro para “dar também mais voz, mais possibilidade, mais dignidade e mais oportunidade de participação à toda a gente” e, muito em particular, “à comunidade cigana que sofre com um enorme preconceito” em Portugal.

Na manifestação, ouviram-se igualmente desabafos e palavras de solidariedade para com as pessoas com deficiência.

“Temos que fazer muito mais para garantir dignidade e verdadeira vida autónoma e independente para toda a gente no nosso país, incluindo as pessoas com deficiência”, reforçou o líder do LIVRE.

Rui Tavares assegurou que tal como “muitos preconceitos e superstições que foram vencidos e erradicados” no passado, tornando-se quase irrelevantes hoje em dia, “também o racismo pode, deve e vai ser erradicado”. Sublinhou que “o racismo não tem razão de existir”, pelo que também se conseguirão “erradicar e vencer o preconceito homofóbico, a ciganofobia e todos os outros preconceitos” ainda vigentes na sociedade portuguesa.

Em vésperas de tomada de posse no Parlamento, dezenas de manifestantes saíram em apoio às três deputadas afrodescendentes, após um grupo de cidadãos ter lançado uma petição, com milhares de assinaturas, para impedir a tomada de posse de Joacine Katar Moreira, cabeça de lista eleita pelo LIVRE.

As várias vozes que se fizeram ouvir na manifestação, realizada na noite desta segunda-feira frente à Assembleia da República, em São Bento, foram de protesto e de solidariedade, numa iniciativa espontânea promovida pelo “Coletivo Resistimos”.

Entre ativistas, militantes de alguns partidos políticos e pessoas que se identificam com a causa dos direitos humanos, vários foram os cidadãos que saíram à rua para expressar apoio às deputadas negras que, esta semana, ocupam assento entre os 230 lugares de deputados no Parlamento português.

A noite foi marcada por intervenções livres e pronunciamento de slogans que, no conjunto, exaltaram a defesa dos direitos dos imigrantes e condenaram a pretensão de referida petição, com mais de 22 mil assinaturas, cujo objetivo é o de impedir Joacine Moreira de assumir o seu lugar no Parlamento.

José Pereira, membro do movimento “Consciência Negra”, um dos intervenientes no ato, disse que a eleição das deputadas negras afrodescendentes constitui uma vitória saída das legislativas de 06 de outubro. O ativista enaltece o facto por ser a primeira vez que isto acontece na história da democracia portuguesa.

“Essa eleição é o resultado da luta nas ruas do movimento negro durante os últimos anos”, afirmou, diante de um aglomerado de apoiantes que ia aplaudindo as comunicações e gritando palavras de ordem. Pereira pediu vigilância redobrada nos próximos anos contra a extrema direita, “que agora está de uma forma assumida no Parlamento”.

O ativista considerou que a presença de deputadas negras na Assembleia da República Portuguesa «representa um virar de página» relativamente às medidas necessárias para combater o racismo, o que passa antes pelo combate à precariedade e à austeridade e pela adoção de uma outra lei da nacionalidade, entre outras.

“É necessário combater a precariedade e a lógica que impõe às mulheres negras a dupla ou a tripla jornada de trabalho para se sustentar a si e ao seus filhos”, advertiu, exortando as três deputadas afrodescendentes a se juntarem a um programa de combate efetivo do racismo.

“O ataque à diversidade será respondido com unidade”

Manuel Afonso, que interveio em nome do Movimento Alternativa Socialista, juntou-se ao grupo para celebrar a vitória que representa a entrada para o parlamento português de Joacine Moreira, pelo LIVRE, da Beatriz Gomes Dias, pelo Bloco de Esquerda (BE), e de Romualda Fernandes, pelo Partido Socialista (PS).

“É uma vitória” – argumentou – “porque surge de um movimento crescente que tem vindo a ganhar voz na sociedade portuguesa contra o racismo”. Na ocasião, criticou a violência policial contra a juventude negra e pronunciou-se a favor de uma lei da nacionalidade que considere aqueles que nascem no solo português, bem como pelos direitos dos imigrantes e refugiados.

Nesta concentração também de protesto, Manuel Afonso considerou “gravíssimos” os ataques desferidos contra Joacine Moreira por ser gaga e ter permitido exibir-se uma bandeira da Guiné-Bissau, seu país natal, durante a celebração da sua eleição a deputada na noite eleitoral de 6 de outubro.

Criticou as forças reacionárias, xenófobas e racistas que lançaram ataque contra a deputada do LIVRE, entendido como um ataque a todos aqueles que lutam pela igualdade de direitos e de oportunidade. E justificou: “mesmo que a onda de ódio racista, xenófoba e machista fosse apenas contra a Joacine – e não é – merecia esta concentração de protesto».

Afonso avisou mais adiante que não são inocentes nem espontâneos os ataques e o abaixo-assinado, nem tão pouco as “fake news” (notícias falsas) que circulam à volta deste caso.

Avisou também que, contra tais ameaças, toda a unidade é necessária. “As nossas diferenças existem, mas são secundárias perante a ameaça da serpente fascista e neo-fascista, do reacionarismo e da xenofobia” – admitiu.

Perante “todas estas contrariedades e contradições”, garantiu: “estas ameaças não nos vão calar, não nos vão infringir o medo”. E completou: “o ataque à diversidade será respondido com unidade. A diversidade é a nossa força”.

De referir que a manifestação aconteceu na semana em que é divulgado um estudo do Centro de Pesquisa Gallup, que refere que Portugal ocupa a primeira posição no Índice de Aceitação de pessoas migrantes que entram na União Europeia. (x)

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