Elisabeth Almeida (Correspondente em São Paulo)
Um grupo de 200 enfermeiros brasileiros capacitados, e com anos de experiência em hospitais do Brasil, lançou um apelo às autoridades sanitárias portuguesas a solicitar o exercício da profissão em Portugal, numa altura em que o país regista 311 mortos por Covid-19 e mais de 300 profissionais da saúde estão infectados.
O Movimento, que integra profissionais com residência legal ou em processo de regulamentação em Portugal, lembra que Portugal tem um número muito grande de profissionais contaminados e de quarentena – oficialmente 1750 estão neste momento em casa, em vigilância ativa.
Em resposta dada nas redes sociais, o grupo de enfermeiros brasileiros garante ter recebido a seguinte mensagem da Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco.
“Meus queridos amigos brasileiros, não me levem a mal, vocês não têm cédula e a maior parte não tem condições para ter”, pelo que, para já, não podem exercer em Portugal, onde residem 151 mil imigrantes provenientes do Brasil, a maior comunidade estrangeira do país.
“Solenemente, na presença de Deus e desta assembleia, juro: dedicar minha vida profissional a serviço da humanidade, respeitando a dignidade e os direitos da pessoa humana, exercendo a enfermagem com consciência e fidelidade” (…) “atuar junto à equipe de saúde para o alcance da melhoria do nível de vida da população; manter elevados os ideais de minha profissão, obedecendo aos preceitos da ética, da legalidade e da moral, honrando seu prestígio e suas tradições”.
Este foi o juramento feito por um grupo de brasileiros, graduados em enfermagem que, desde o começo da pandemia mundial causada pelo coronavírus, luta para ter o direito de exercer a profissão em Portugal, onde residem legalmente ou em processo de regulamentação.
São mais de duzentas pessoas capacitadas e com anos de experiência em hospitais do Brasil e mesmo assim a Ordem de enfermagem portuguesa não aceita a ajuda por uma questão de diferença na carga horária de estágio durante a graduação.
As disciplinas são iguais e com a mesma quantidade de horas, porém a carga horária exigida para o estágio em Portugal é bem maior do que a do Brasil, sendo essa a única diferença na formação dos profissionais nativos e imigrantes.
De acordo com a enfermeira e fisioterapeuta, Tatiana Gutierrez De Miranda, para igualar este quadro é necessário o processo de equivalência, que além de burocrático e durar entre seis meses e um ano, custa em torno de 5 mil euros.
“A sensação que nós temos é que existe um certo preconceito, já que eles dificultam e limitam muito o acesso dos enfermeiros brasileiros” disse.
“Agora com esse caos da pandemia nós criamos um movimento para nos disponibilizar à Portugal, já que o país está com um número muito grande de profissionais contaminados e de quarentena”, reitera.
“Há vários hospitais do país pedindo enfermeiros e apoiando a nossa atuação, mas, ao chegar na Ordem, não somos liberados. A Bastonária da Ordem dos Enfermeiros de Portugal, Ana Rita Cavaco, disse em suas redes sociais, em resposta a um dos integrantes do nosso grupo que tal acordo não seria possível”, assegurou a enfermeira e fisioterapeuta em declarações ao jornal É@GORA.
A resposta mencionada por Tatiana Gutierrez De Miranda foi enviada via Instagram, onde Ana Rita Cavaco diz não abrir mão da qualidade dos profissionais.
“Meus queridos amigos brasileiros, não me levem a mal, vocês não têm cédula e a maior parte não tem condições para ter. Não ser rigoroso nesta altura é colocar todos em risco. Quem não cumpre os critérios, não vai ter facilidades, nem antes e nem agora. Para o bem de todos. Esta é a hora de quem sabe, não de quem quer aligeirar a segurança. Um beijo e obrigada a todos”, concluiu.
Outra queixa dos enfermeiros é que o Tratado de Amizade entre os países não está sendo cumprido.
“De acordo com o artigo 47° do tratado, deveríamos ter os mesmos direitos de exercer nossa profissão em solo lusitano. O que é mais injusto é a forma de avaliarem. Para eles, o nosso tempo de experiência não vale de nada e a impressão que fica é que querem dinheiro, já que a complementação com estágios não é barata”, disse Fabiana Figueiredo Tavares, enfermeira há 19 anos e uma das administradoras do grupo de brasileiros.
O artigo mencionado diz: “Se o acesso a uma profissão ou o seu exercício se acharem regulamentados no território de uma das partes contratantes por disposição decorrentes da participação deste em um processo de integração regional, poderão os nacionais da outra parte contratante aceder naquele território a essa profissão e exercê-la em condições idênticas, as prescritas para os nacionais dos outros estados participantes nesse processo de integração regional”.
A aprovação de mão de obra estrangeira já é uma realidade em vários países que aceitaram a atuação de profissionais estrangeiros no Sistema Nacional de Saúde, como a Espanha e Estados Unidos.
No caso dos espanhóis, o retorno foi quase que imediato, tendo o país tido, no dia 5 de abril, uma queda no número de mortos por conta do coronavírus no país, sendo o segundo dia seguido a apresentar melhoras no quadro clínico dos pacientes, embora o número de contaminados tenha aumentado.
De acordo com Fabiana Figueiredo Tavares, tal avanço teria uma explicação lógica.
“Por nós, profissionais da saúde, na linha de frente no combate ao Covid-19, quanto antes melhorarem a mão de obra para revezar com os colegas é melhor para a equipe como um todo, o desgaste acaba com o profissional de saúde.
O estresse reduz nossa produção e baixa a imunidade absurdamente, ou seja, todos ficarão doentes. Isso não é achismo, é científico”, explicou ao jornal É@GORA.
O Movimento dos enfermeiros brasileiros já entrou em contato e também enviou cartas a diversos meios de comunicação e também unidades sanitárias, como o Hospital Lusíadas, Hospital Santa Maria, Hospital de Cascais, Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa da Amadora, Hospital Santa Cruz, Hospital São Francisco Xavier, Hospital Particular de Viana do Castelo, Centro hospitalar de Vila Nova de Gaia, Hospital do Litoral Alentejano e muitos outros; todos recusados por conta de uma determinação da Ordem portuguesa.
Além das instituições, a Embaixada do Brasil em Portugal também foi informado sobre a situação, devendo tomar as devidas providências nos próximos dias.
Em contrapartida, o Sindicato de Todos os Enfermeiros Unidos (SITEU) reitera a necessidade de contratar “imediatamente” mais médicos, enfermeiros e auxiliares para trabalhar no Sistema Nacional de Saúde, ajudando não só no tratamento dos pacientes contaminados, mas também aumentando a mão de obra nos hospitais, que anda desfasada por conta dos mais de 300 profissionais positivados com Covid-19.
“O défice de enfermeiros no SNS é crónico e denunciado há muitos anos, mas o enorme afluxo de doentes nas últimas semanas está a tornar a situação impossível. Os enfermeiros estão a trabalhar horas intermináveis sem folgas, sem condições de proteção mínimas, expostos ao contágio. E a situação ainda vai piorar mais com a subida esperada de casos nas próximas semanas”, refere a presidente do SITEU, Gorete Pimentel, citada num comunicado enviado à agência Lusa.
A própria Ordem emitiu, no passado sábado, 4 de abril, um pedido para que enfermeiros disponíveis ajudem no combate à Covid-19.
A entidade pretende profissionais que “tenham experiência em cuidados intensivos, que se encontrem em unidades de cuidados de saúde primários e que possam, temporariamente, em regime de mobilidade, reforçar as unidades de cuidados intensivos”, diz a nota.
“Face ao período de Emergência de Saúde Pública Internacional em que nos encontramos, atenta a propagação global do novo coronavírus e à ameaça que o mesmo já representa para a Saúde Pública nacional, compete à Ordem dos Enfermeiros e à totalidade dos seus membros, em articulação com as autoridades de saúde e as entidades competentes, colaborar na efetiva implementação das medidas de contenção consideradas adequadas”, conclui o comunicado assinado por Luís Filipe Barreira, vice-presidente do conselho diretivo da Ordem dos Enfermeiros de Portugal.
Para se ter uma dimensão real da situação no Sistema Nacional de Saúde, Portugal registou hoje 311 mortes e 11.730 casos confirmados, depois de até sábado assinalar 266 mortes causadas pelo Covid-19 e, no domingo, encerrado o dia com 295 vítimas fatais e 11.278 casos confirmados e mais 86.370 casos suspeitos, colocando o país na 15ª posição no ranking mundial. (EA)
Para saber mais sobre o Movimento dos Enfermeiros Brasileiros: https://www.instagram.com/enfermagememportugal/ ou https://www.facebook.com/Enfermagem-em-Portugal-103280014647893
Uma vergonha a atuação da Ordem dps Enfermeiros de Portugal! O país virou escola de Enfermagem pra outros países da Europa, pois trabalhar em Portugal é trabalhar sem condições, sem respeito, sem salários dignos! A ordem dos enfermeiros é firme, cobra uma qualidade baseada apenas em uma grade curricular escolar, mas é incapaz de avaliar o desenvolvimento profissional de enfermeiros brasileiros que atuam anos como enfermeiros! Só quem perde é Portugal e sua população!
É muito triste ter uma resposta desta por parte da Bastonária. Como julgar-nos incapacitados ou de pouca qualidade profissional? Sra. Rita Cavaco, peço desculpas, mas deveria ao menos, tentar informar – se das qualificações e experiências das centenas de Enfermeiros brasileiros, que foram induzidos ao equivoco, por uma informação constante no site da OE – em que traz informações sobre Reconhecimento da profissão apenas para fins de exercer o trabalho em Portugal -, e que lá, submeteram seus documentos como uma ilusória tentativa. Sra Rita Cavaco, também peço desculpas novamente, mas a convido a informar – se de como funcionam o ensino e estágios da Enfermagem no Brasil, em hospitais modelo para Pesquisas e cuidados a pacientes críticos (também)… Falo de Hospital das Clínicas, Santa Casa de Misericórdia,.. Sem falar em nossas Pós graduações em Hospitais como Albert Einstein, Sírio Libanês.. Enfim, ficaria aqui a listar muitos… Sem falar na experiência em Saúde Pública. Exponho isto pelos meus Colegas Enfermeiros que estão a tentar esta Equivalência “tão difícil” aqui em Portugal…Vamos deixar o preconceito e política de lado….. Por que se recusar a receber ajuda de quem poderia muito contribuir neste momento? Somos profissionais íntegros, capacitados, legalizados neste País, e que não queremos assistir a tudo isto, de braços cruzados. Nosso grito ainda é fraco.. Mas continuaremos lutando.. Porque somos Enfermeiros, e fizemos um Juramento!
É isso ai minha amiga Fabiana Tavares COMPETENTE e muito amada !
Saudades …. ( ANE )
A Ordem está sendo arbitrária na análise. Tenho eu, por exemplo,4816 horas na minha graduação e 3050 horas declaradas de ensino clínico. Consideraram apenas 1200 horas e a explicação para tal feito descreveu aquilo que está no PPC do meu curso: prática clínica é atendimento direto ao usuário em estágio de saúde comunitária e hospitalar. Mesmo após o recurso a ordem desconsiderou documentos oficiais da universidade brasileira e foi arbitrária. Isso é sim preconceito e desconsidera a regulamentação sobre o assunto e o Acordo entre o Brasil e Portugual.