Deputadas afrodescendentes apelam à adoção da lei da nacionalidade no 1º. debate parlamentar

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As deputadas afrodescendentes do partido LIVRE, Joacine Katar Moreira, e do Bloco de Esquerda, Beatriz Dias, confrontaram hoje, pela primeira vez, no Parlamento, o primeiro-ministro português, António Costa, apelando-o a adotar “medidas concretas” para alterar a lei da nacionalidade, e a dar aos imigrantes e minorias étnicas “o mesmo respeito e a mesma importância” que Portugal tem dado aos emigrantes e lusodescendentes.

“Desejava que o senhor primeiro-ministro explicasse como é que irá incentivar um olhar de pertença à comunidade nacional aos imigrantes rejeitando a nacionalidade imediata aos seus filhos”, afirmou Joacine Katar Moreira, naquela que foi a sua primeira intervenção como deputada na Assembleia da República, para discutir um tema que marcou a tónica da campanha eleitoral do LIVRE.

Estreando-se também no Parlamento enquanto deputada pelo Bloco de Esquerda, Beatriz Dias interveio questionando o atual chefe do governo português sobre a definição de uma data para a aprovação da lei da nacionalidade.

“Como lhe disse, a revisão da lei da nacionalidade é um projeto que o Bloco (de Esquerda) já integrou nessa legislatura e é um caminho que deve ser feito o quanto antes. O que lhe pergunto senhor primeiro-ministro é: quando é que podemos ter uma lei da nacionalidade que garante de uma forma inequívoca que quem nasça em Portugal é português honrando assim o compromisso aprofundado o direito de solo que assumiu no seu programa?”, questionou Beatriz Dias.

A deputada considerou que o que Portugal precisa “é mesmo mudar a lei” da nacionalidade, “porque o essencial não se resolve com simples mudança administrativa”.

“Apesar de afirmar que Portugal é um país orgulhosamente aberto ao mundo a quem queira viver em Portugal, o programa do governo continua a não incluir qualquer proposta de alteração da lei da nacionalidade que consagre o princípio do direito do solo. É uma omissão difícil de compreender”, considerou Beatriz Dias, que falou depois da deputada do partido LIVRE.

Intervindo em momentos distintos, para responder às questões levadas por cada uma das parlamentares, o primeiro-ministro português deu respostas similares no que concerne à imigração, assinalando que nas últimas duas décadas Portugal registou grandes avanços nessa matéria.

“Houve um avanço muito grande na nossa lei da nacionalidade em 2006/7”, assegurou António Costa, frisando que Portugal abandonou o tradicional o critério de ´jus sanguini` para adotar também o critério do ´jus soli`, cuja regra assenta na ideia de que “as crianças que nascem em Portugal, ainda que filhos de pais estrangeiros, ou de não nascidos em território nacional, são também portugueses”.

“E é necessário aprofundar e fazer avaliação para levar até todas as consequências os critérios do ´jus soli`, sobretudo, eliminar grande parte dos obstáculos burocráticos que têm dificultado a atribuição da nacionalidade a quem a lei já reconhece o direito a ter nacionalidade originária por ter nascido no nosso país”, referiu António Costa.

Contudo, o primeiro-ministro português avisou: “É preciso avaliar bem aquilo que queremos e não abrir à porta àquilo que não queremos. Não basta fazer uma escala em Portugal, para que quem nasça em Portugal seja português”.

Para António Costa, “tem que haver um vínculo suficiente com o território nacional e respeitar também a vontade dos pais de se querem ou não querem que o seu filho seja português”, até porque, acrescentou: “também não temos que impor a nacionalidade como critério único ou a forma única de inclusão na sociedade portuguesa. Quem nasce em Portugal pode ter também o direito de não querer ser português e esse direito também temos que o respeitar”.

Remetendo o debate para o que está expresso no programa da ação governativa da presente legislatura, o primeiro-ministro português falou dos compromissos que assumiu, no campo da imigração, e que já vêm refletidos nas promessas eleitorais do Partido Socialista, força política no poder em Portugal.

“Agora, o compromisso que nós assumimos é de avaliar bem os problemas que existem fruto de entraves burocráticos, fruto de deficiente interpretação da lei, ou aquilo que exige mesmo, porventura, uma efetiva alteração do quadro legislativo”, afirmou.

No entanto, António Costa afastou a possibilidade de adotar um regime de quotas à imigração, e destacou a criação neste Governo de uma secretaria de Estado para a Integração e as Migrações.

Ambiente

A deputada única do LIVRE no Parlamento questionou ainda o primeiro-ministro sobre duas outras bandeiras da sua campanha: uma relacionada com os ordenados – o LIVRE exige no seu programa eleitoral a fixação de um salário mínimo nacional de 900 euros – e, outra, ligada ao orçamento para combate às alterações climáticas.

Joacine Katar Moreira referiu que “não há nenhum combate às desigualdades com ordenados mínimos absolutamente miseráveis” e lembrou que “ninguém nesse hemiciclo conseguiria viver” com o atual salário mínimo, 600 euros.

Reagindo, António Costa frisou que, “relativamente à questão ambiental, Portugal foi não só o primeiro país do mundo logo em 2016 a se comprometer com os objetivos da neutralidade carbónica 2050”, como foi “também o primeiro país do mundo através deste governo que (o atual) dá continuidade a aprovar o roteiro para neutralidade carbónica fixando-a às metas, aliás, mais ambiciosas para essa Primeira Década até 2030”.

“E esse roteiro não tem só metas. Tem medidas políticas e tem estimativas orçamentais. Portanto, quando pergunta onde está o orçamento, (respondo) que está nesse roteiro e tem que ir se concretizando ano a ano quer da parte do Estado, quer da parte do investimento privado, que é também necessário para que a sociedade portuguesa cumpra esse objetivo”, disse António Costa, assegurando que “até 2050”, Portugal vai alcançar ao que se apelida de “neutralidade carbónica”.

Em 2019, mais de 180 países, incluindo Portugal, comprometeram-se em linha com o Acordo de Paris, a contribuir para limitar o aumento da temperatura média global do planeta a 2ºC., e a fazer esforços para que esta não ultrapasse os 1,5ºC, um acordo político que leva os Estados a assumirem a liderança no combate às alterações climáticas visando à neutralidade carbónica.

“Por isso, aquilo que estamos certos é que ao longo dessa legislatura seremos capazes de dar avanços concretos para cumprir as metas desta Primeira Década até 2030 e continuarmos a lançarmos as bases das políticas necessárias para alcançarmos a neutralidade carbónica até 2050”, garantiu António Costa no primeiro debate parlamentar cujo objetivo era apresentar o programa do governo para a presente legislatura.

Pela primeira vez na História, o Parlamento português tem agora três mulheres negra como deputadas e todas com um percurso de luta em defesa das minorias e nas questões étnico-raciais: além de Beatriz Dias (BE) e Joacine Katar Moreira (LIVRE), está a deputada eleita pelo Partido Socialista, Romualda Fernandes. (MM)

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