O cantor português Dino D’Santiago, filho de pais cabo-verdianos, homenageou os imigrantes africanos pelo esforço que prestam ao desenvolvimento de países europeus como Portugal. O músico dedicou um dos seus temas à luta da comunidade imigrante, durante a memorável estreia, esta quarta-feira, na 21º Festival Músicas do Mundo de Sines (FMM), que encerra em grande este sábado, 27 de julho. O autarca do município, Nuno Mascarenhas, considera em declarações ao Jornal É@GORA que a integração dessa comunidade ao longo de várias gerações tem sido feita de forma sustentada, “o que não tem acontecido noutros concelhos do país”.
Zeferino Moura, 59 anos de idade, faz a sua vida em Portugal como imigrante sem atropelos. Veio de Cabo Verde com 13 anos por intermédio do pai. Fixou-se em Faro, no sul do país, hoje considerado a sua segunda pátria. Em Sines, instalou-se em 1984 para trabalhar na área da construção civil. Trouxe a família e por cá foi ficando, tempo que usou ao longo de mais de uma década para erguer uma habitação própria no terreno que comprou no Bairro Amílcar Cabral. Mas, com a crise em Portugal, optou por ir e vir para experimentar a sorte em países como a Mónaco, Holanda, França e Alemanha, entre outros.
Pai de três filhos nascidos portugueses – já crescidos e orientados na vida –, Moura é um dos que gosta, quando pode, de visitar o Festival Músicas do Mundo (FMM) de Sines, que todos os anos tem lugar por estas alturas na costa alentejana onde vive uma interessante comunidade cabo-verdiana. “O festival é bom”, garante, “porque dá emprego a muitas pessoas”, ainda que em regime temporário.
Ouviu falar da atuação de alguns músicos da sua terra natal como Lucibela e Dino D’ Santiago, nascido no Algarve, que conheceu desde menino em Quarteira quando este tinha cerca de um ano. “A mãe do Dino é minha vizinha em Cabo Verde”, recorda ao confirmar ser amigo dos seus pais.
Nessa noite de quarta-feira, 24, prometeu ir ver o concerto do luso-cabo-verdiano, que brindou o público com o seu mais recente trabalho “Mundu Nôbu”. A noite no Castelo de Sines foi memorável para a estreia do artista agora no apogeu. O músico dedicou um dos temas do seu reportório à luta imigrantes por uma integração plena em Portugal. “Ele canta bem”, testemunha o conterrâneo Moura.
Sines: um bom exemplo de integração
Voltando ao bairro, Zeferino Moura diz sentir-se “muito bem” aqui no sítio. “Tenho o meu emprego e o resto a gente resolve”, afirma ao Jornal É@GORA, elogiando o perfil do bairro onde há paz, harmonia e convívio entre todos os moradores. O ambiente e a estrutura urbanística, a contrariar com o mau exemplo de alguns bairros na Área Metropolitana de Lisboa, são de louvar. “Aqui é uma zona sossegada e isso é um alívio para uma pessoa que quer construir uma família”, afirma sem vacilar. “Ganha-se pouco mas um gajo vai levando a vida”, remata o cidadão cabo-verdiano à beira da reforma, que também adquiriu por direito legal a nacionalidade portuguesa e francesa.
Se falarmos de políticas de integração, Sines é uma cidade em crescimento considerada como um “bom exemplo” por estar entre os concelhos portugueses que melhor acolhe os imigrantes. O polo industrial e o setor das pescas atraíram muitos africanos, sobretudo cabo-verdianos. “Aqui, trabalho existe”, assegura Moura. “Há neste momento falta de mão de obra para determinadas áreas”, refere.
Já a presidente da Associação Cabo-verdiana de Sines e Santiago do Cacém, Gracinda Luz, precisa que, “para o sexo feminino, é mais complicado porque abarca mais a área da restauração e doméstica”.
Até hoje, alguns, incluindo os filhos, continuam a emigrar para outros países da Europa em busca de melhores condições de vida. É um ciclo que depende da situação em Portugal. O município trabalha em prol da comunidade imigrante, o que, na opinião da dirigente associativa, facilita a integração. É um processo que se desenvolve em parceria com a associação, que tem apresentado propostas.
A integração também se faz no plano político, havendo já cabo-verdianos nas listas partidárias a nível das autarquias. Gracinda prefere não falar de discriminação. “É uma palavra muito vaga”, precisa, porque “há agora uma maior procura das comunidades imigrantes para fazerem parte das listas, mas há também da parte dos partidos portugueses uma procura”. Admite que “já se vê maior abertura”, embora a quota de participação política dos afrodescendentes ainda seja bastante reduzida. “Tem sido um processo lento, mas tem de ser um passo de cada vez”, assume, reconhecendo, entretanto, que a comunidade deve envolver-se mais para reduzir a abstenção no ato eleitoral. “É um trabalho que está a ser feito”, garante, sublinhando que «a pouco e pouco vamos conseguir ter uma maior relevância na vida política portuguesa».
Integração com sustentabilidade
Não são comparáveis as condições de integração das comunidades imigrantes no município. “Sines sempre teve uma grande comunidade de pessoas que vieram das antigas colónias há várias décadas. Naturalmente que se integraram na comunidade local”, lembra o presidente da Câmara Municipal de Sines, Nuno Mascarenhas, referindo-se aos cabo-verdianos que vieram engrossar o corpo de pescadores.
A comunidade imigrante está presente a todos os níveis, incluindo o desportivo, social e político, acrescenta o autarca referindo-se à multiculturalidade de Sines. “São sineenses como todos os outros sem qualquer discriminação uma vez que fazem parte da comunidade há bastantes anos”, sustenta.
Nuno Mascarenhas diz que o processo de integração é normal e “não é de agora”. Sublinha neste âmbito a colaboração entre a Câmara e a Associação Cabo-verdiana de Sines e Santiago do Cacém para a integração dos referidos cidadãos. “Isso tem funcionado muito bem e o festival é também uma forma de poder aproximar as pessoas, nomeadamente dos países de língua oficial portuguesa”, adianta. “É que cada vez que um desses artistas e grupos vem a Sines há uma grande receção por parte da comunidade, nomeadamente a cabo-verdiana”.
Para além dos apoios financeiros que recebe, a associação participa em várias atividades locais, tal é o exemplo das Tasquinhas na Avenida Vasco da Gama, durante mais de 20 dias, onde ela tem divulgado a gastronomia e a cultura africanas. (X)