Manuel Matola
A comunidade imigrante em Portugal lançou hoje uma petição a apelar o governo português para abertura de vagas para agendamento no SEF, a quem acusam de “tratamento discriminatório” de migrantes extra comunitários.
Há “casos de grande volume de imigrantes” que esperam “oito meses” para se regularizar, quando membros familiares dos Cidadãos Europeus e portugueses “tiveram abertura de vagas periódicas para efetiva regularização de forma sequencial”, denunciam as advogadas brasileiras Jamile Jambeiro Portela e Tatiana Kazan Ferreira, autoras da petição.
O documento que em duas horas conta com quase uma centena de subscritores, é destinada ao Presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, ao primeiro-ministro, António Costa, bem como ao ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, responsável pelo SEF, e ao chefe da diplomacia portuguesa, João Cravinho, para que ajudem na resolução de uma situação que tem vindo a inquietar milhares de cidadãos estrangeiros provenientes de países fora do espaço Schengen.
Em 20 pontos, o documento aponta para os vários desafios que os cidadãos estrangeiros em Portugal enfrentam no que diz respeito à legalização quando o Serviço de Estrangeiros e Fronteira está em contagem decrescente do processo de extinção e transição para nova Agência para a Integração, Migrações e Asilo.
Na petição a que o jornal É@GORA teve acesso, os solicitantes usam “como parâmetro” o período de 2022. “Estatisticamente, constatava-se uma média mínima de 20.000 (vinte mil) cidadãos estrangeiros aguardando abertura de Reagrupamento Familiar”, cujas vagas para os vários artigos da Lei de Estrangeiro não são conhecidas “desde outubro de 2022”.
Os imigrantes lembram às autoridades portuguesas dois dos vários constrangimentos que vivem diariamente: “1.º Verifica-se uma espera de 8 meses para abertura de agendamento no SEF para os casos de grande volume de imigrantes que necessitam regularizar-se, diferentemente ao que toca para os membros familiares dos Cidadãos Europeus e portugueses nos termos da Lei n.º 37/2006, de 09 de Agosto e estrangeiros com visto que tiveram abertura de vagas periódicas para efetiva regularização de forma sequencial” e, a seguir, fazem saber que “não houve abertura de vagas desde OUTUBRO de 2022 para reagrupamento familiar e outras modalidades de Autorizações de Residência com dispensa de visto, previstos nos artigos 90.º, n.2, 91.º, n.4, 91.º-B, n.9 e 10, 92.º, n.3 e 4, 93.º, n.3, 98.º, n.2 e 3, 122.º e ss, 123.º da lei n.23/2007”.
Por isso questionam a fundamentação apresentada pelo SEF para a tomada de algumas decisões, pois, dizem, o órgão responsável pela legalização dos imigrantes em Portugal optou pela abertura de vagas para determinado grupo de cidadãos estrangeiros e não para outro.
“Sabe-se que o SEF encontra-se em processo de extinção e transição para AIMA (Agência para a Integração, Migrações e Asilo), oficialmente publicada Decreto Lei n.º41/2023, tão somente no dia 02/06/2023 com previsão de vigência apenas no dia 29/10/2023, logo, não justifica a falta de abertura dos agendamentos no SEF nos artigos indicados acima durante este lapso temporal com base na argumentação de estarem em transição deste órgão”, consideram.
Segundo dizem, “se fosse plausível tal argumento, não haveria abertura de vagas para agendamento no SEF aos respetivos membros familiares dos Cidadãos Europeus e portugueses, processos de Manifestação de Interesse, cidadãos titulares estrangeiros de vistos sem agendamento, renovação em casos excecionais não abrangidos pela renovação automática, títulos de residência extraviados ou perdidos e para alteração de dados nestes 8 meses (outubro/2022 até junho/2023)”.
Nesse sentido, a comunidade migrante pede igualdade de tratamento, porque, refere, “a transição de um órgão não pode tornar a única instituição de regularização de estrangeiros ineficaz e sem funcionamento aos estrangeiros que estejam a residir em Portugal, especialmente quando se trata de estrangeiros menores de idade, estudantes e em tratamento médico como tem havido para os outros artigos da Lei de Estrangeiro citados”.
Férias de Verão e visita aos familiares
No mesmo documento, os imigrantes queixam-se também de outro problema que aflige as famílias que pretendem se reagrupar ou visitar-se durante as férias escolares do Verão, que hoje começou, e explicam o que está a acontecer. É que a não abertura de vagas para Reagrupamento Familiar está a causar constrangimentos que “ferem a Unidade Familiar”, pois há situações de estrangeiros menores de idade e membro familiar de cidadãos titulares de Autorização de Residência que encontrando-se em férias escolares estão “sem possibilidade de regressar ao seu país de origem para visitar familiares, ou cumprir decisões judiciais, bem como acordos bilaterais referente às responsabilidades parentais com seu outro progenitor de nacionalidade estrangeira que resida fora de Portugal”.
Ou seja, a demora na abertura de vagas para reagrupamento familiar para cidadãos estrangeiros sem qualquer vínculo consanguíneo com um europeu leva a que, por exemplo, duas crianças imigrantes em Portugal possam ter férias diferentes: uma podendo viajar para ver os familiares, outra não.
“Infelizmente também vemos um tratamento discriminatório por haver abertura de vagas para membro familiares de cidadão europeus e nacionais frequentemente e não haver abertura de vagas para membros familiares de cidadão residentes legais em Portugal”, lê-se na petição em que se questiona: “Qual a diferença de um filho menor de um cidadão português para um filho menor de um cidadão estrangeiro com autorização de residência?”.
Os peticionários só encontram uma justificação.
“Essa situação é flagrante declínio da dignidade humana, as suas famílias e limitativo quanto à liberdade de ir e vir do cidadão”, afirmam, lembrando como uma decisão tardia “fere a Unidade Familiar e a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, em seus principais princípios basilares como previsto no Art. 1º – Dignidade do Ser Humano” que assinala que “A dignidade do ser humano é inviolável. Deve ser respeitada e protegida” enquanto o Art. 6.º – Direito a Liberdade e a Segurança prevê que “toda a pessoa tem direito à liberdade e segurança”, dizem.
“Visto de curta duração – turista”
A petição denuncia ainda uma situação que se mantém desde o período da pandemia.
“Dado o decreto lei n.º 90/2022, de 30 de dezembro onde prorroga o ´visto de curta duração – turista` a medida que nem estamos em situação pandémica, não sendo justificado essa prorrogação para não enfrentar os problemas estruturais deste órgão que vem se alargando algum tempo e atempadamente a pandemia. Ora bem, os membros familiares e nomeadamente os cidadãos estrangeiros menores de idade que encontram-se no status ilegal perante o Espaço Schengen, abrangido pelo Decreto Lei n.º 90/2022, de 30 de dezembro, mantêm-nos numa situação de circulação no espaço Schengen limitativo, sem nem tocar em questões praticas, nomeadamente, nos setores de acesso à saúde e benefícios junto a segurança social que não conseguem ter uma tratamento igualitário, mesmo quando um dos seus progenitores são residentes legalmente e contribuem para este pais em sede de impostos e contribuições na Segurança Social”.
Apontando outros problemas de violação de leis nacionais e comunitárias, designadamente Convenções e Tratados Internacionais em que Portugal é signatário, os proponentes da petição consideram “injusto” que não haja serviço que funcione de forma digna e que seja oferecido a todos os imigrantes, sejam qual for a sua modalidade de regularização prevista em Lei e nacionalidade. (MM)