Julgamento do ativista Mamadou Ba adiado para setembro

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Mamadou Ba. Foto retirada do Facebook

Manuel Matola

O julgamento de Mamadou Ba foi adiado para setembro, anunciou hoje o ativista dos direitos humanos que, do Canadá onde reside, teve a informação através da sua advogada em Portugal.

“Fui notificado através da minha advogada”, disse Mamadou Ba ao jornal É@GORA minutos depois de ter anunciado a alteração da data do julgamento na sua rede social Facebook, onde escreveu uma curta nota: “O julgamento contra o nazi foi adiado para setembro”.

E de seguida agradeceu o apoio internacional que tem recebido no âmbito de uma campanha global antirracista para defender o ativista que “vem sendo perseguido em Portugal por conta dos seus posicionamentos antirracistas”, segundo denunciam as organizações pró-direitos humanos.

“Obrigado a todes pela solidariedade. A luta continua!”, disse MMamadou Ba.

O ativista deveria ser ouvido em tribunal entre os dias 11 de abril e 10 de maio próximos, na sequência de um processo movido pelo líder nazista português Mário Machado, conhecido pelo seu envolvimento na morte de Alcindo Monteiro, um jovem negro de origem caboverdiana, assassinado em Lisboa, em 1995.

O intelectual luso-senegalês Mamadou Ba é indiciado de 12 processos-crime, três dos quais já arquivados e nove ainda em andamento e que seriam julgados no próximo mês, no Campus da Justiça (Parque das Nações, em Lisboa).

Várias associações pró-direitos humanos, incluindo dos imigrantes, consideram estar a correr uma campanha de “intimidação no sentido de silenciar Mamadou Ba” em Portugal, mas que, na verdade, é um “sinal claro para que o movimento negro e antirracista se cale”.

Em carta aberta, a que o jornal É@GORA teve acesso, sete associações do movimento negro que atuam no território português, incluindo o SOS Racismo em Portugal, posicionaram-se perante o processo movido contra Mamadou Ba e alertaram:

“Este é um caso eminentemente político, em que através dos tribunais se Iguala um representante de uma força genocida a alguém que sempre lutou pela igualdade e se cauciona indiretamente a narrativa de que ‘racismo’ e ‘antirracismo’ são duas faces de uma mesma moeda. Todo este aparato é também, e sobretudo, um sinal claro para que o movimento negro e antirracista se cale”, consideram as associações que subscrevem a carta: a Bazofo; os Cavaleiros de São Brás; a Consciência Negra; Djass; Emcarneeosso; Kilombo e o SOS Racismo.

Lembrando o “percurso de mais de 20 anos de luta” de Mamadou Ba que sempre primou pela “denúncia das desigualdades raciais na sociedade portuguesa”, as associações dizem que o ativista e dirigente do SOS Racismo em Portugal tem sido “alvo de ataques públicos inflamados que o demonizaram publicamente e lhe valeriam ameaças de morte, pedidos de expulsão, intimidações, insultos quotidianos e queixas judicias que acabariam por ser arquivadas”.

E lançam uma acusação direta à Justiça portuguesa e, sobretudo, a um dos mais famosos juízes em Portugal que pronunciou Mamadou Ba por difamação a propósito de uma publicação do ativista nas redes sociais em que diz que Mário Machado é uma ‘das figuras principais do assassinato de Alcindo Monteiro’.

“Porém”, afirmam as associações, “o que assistimos em 2022, quando o Ministério Público e o juiz Carlos Alexandre decidem acompanhar a queixa do neonazi Mário Machado é um outro nível de intimidação no sentido de silenciar Mamadou Ba, já que, desta feita, a descontextualização e hiperbolização das suas denúncias visa condená-lo em julgamento com início dia 11 de abril, às 14h, no Campus da Justiça (Parque das Nações)”.

E lembram um episódio de agressão policial contra uma mulher luso-angolana que deu origem a um processo em que o juiz Carlos Alexandre testemunhou à favor de um dos agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) indiciados no crime.

“No dia 26 de outubro, em menos de 24 horas, o juiz Carlos Alexandre – agora, sabe-se, testemunha abonatória do agente da PSP Carlos Canha, que agrediu Cláudia Simões, em Janeiro de 2020 – pronunciou Mamadou Ba por difamação a propósito de uma publicação do ativista nas redes sociais em que diz que Mário Machado é uma ‘das figuras principais do assassinato de Alcindo Monteiro’”.

Em fevereiro, Mamadou Ba foi recebido em apoteose por intelectuais brasileiros que se juntaram à campanha global antirracista em defesa do ativista.

No quadro da campanha global em defesa ao ativista luso-senegalês, o historiador brasileiro Babalawô Ivanir dos Santos, Coordenador do Observatório das Liberdades Religiosas do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (OLR/CEAP), recebeu Mamadou Ba em sua casa, no Brasil, onde reuniu vários intelectuais, líderes políticos, religiosos, artistas e académicos brasileiro e não só.

“Temos que refletir profundamente sobre os nossos avanços e retrocessos no combate ao racismo”, apelou Ivanir dos Santos no encontro tido como mais uma etapa no combate ao racismo mundial e que agora se move em torno da ampla frente de apoio ao ativista Mamadou Ba, que “tem atuado na luta contra o racismo e a xenofobia como dirigente da ONG SOS Racismo em Portugal”.

O judiciário português aceitou a queixa crime do neonazista por difamação e o famoso juiz Carlos Alexandre, que acompanhou a acusação do Ministério Público, entendeu que o líder neonazista tinha direito à defesa de sua suposta honra.

“Como se pudesse ser difamado quem se orgulha dos crimes que cometeu e das ideias que professa. Esse mesmo juiz aceitou recentemente ser testemunha abonatória de um agente policial que agrediu barbaramente uma mulher negra, Cláudia Simões, por motivações racistas. Este agente policial faz parte dos 591 policiais identificados numa investigação jornalística como elementos infiltrados das ideias da ultra direita nas forças policiais, com discursos abertamente racistas e violentos citando nominalmente Mamadou Ba e a ex-deputada negra Joacine Katar Moreira com ameaças de violência”, argumentou Camila do Valle, professora de Literaturas Africanas e Literaturas de Língua Portuguesa da UFRRJ, citada numa nota enviada ao jornal É@GORA pelo Observatório das Liberdades Religiosas do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas. (MM)

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