Lei da Nacionalidade: Escritórios de Advogados alertam para eventual “impacto negativo” de concessão indiscriminada da cidadania

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Manuel Matola

A aplicabilidade dos critérios de atribuição da cidadania decorrente da nova lei de nacionalidade “tem que ser ponderada em termos de efeitos práticos e socioeconómicos” para Portugal, porque o eventual “impacto negativo” de concessão deste direito de uma forma indiscriminada “é a possibilidade de fraude à lei”.

O alerta foi feito por duas juristas de diferentes escritórios de advogados que trabalham com processos de legalização de imigrantes em Portugal, quando questionadas pelo jornal É@GORA sobre as possíveis consequências práticas dos projetos de lei da nacionalidade apresentados pelo BE, PAN, PCP e LIVRE.

“Se Portugal passar a impor como critério para ter a nacionalidade portuguesa o critério não de laços de sangue, mas o de lugar de nascimento sem ter outras formas de controlo que acompanhem, é garantidamente uma facilidade para a fraude à lei”, adverte Fabiana Azevedo da NFS Advogados.

O Parlamento português aprovou esta quinta-feira, na generalidade, as alterações aos projetos de lei da nacionalidade do PAN e o PCP, que permitem que a partir de agora os filhos de imigrantes nascidos em Portugal já podem obter a cidadania portuguesa desde que um progenitor seja residente no território português, mesmo que não se encontre legalizado.

“Todas essas propostas têm que ser ponderadas depois em termos de efeitos práticos, quer em termos sociais, quer em termos económicos para o país. A nacionalidade não pode ser atribuída de uma forma indiscriminada, sob pena de entrarmos numa situação de perda da própria identidade”, referiu ao jornal É@GORA Filipa Braga Ferreira, vinculada ao escritório da N-Advogados.

Para a advogada Filipa Braga Ferreira, especialista também em questões de Direito da Nacionalidade, “os critérios de atribuição têm que ser muito bem ponderados e definidos, ou seja, tem que haver aqui uma ligação ao país seja ela qual for. Em todas as situações, ao que me parece, tem que haver aqui uma ligação efetiva sob pena estarmos aqui a criar ligações de nacionalidade efémeras”.

Fabiana Azevedo é perentória: “A facilitação da questão da nacionalidade portuguesa não pode ser absolutamente `feita à maluca`. É tudo muito bonito, mas quem quer ser português é preciso também saber infletir o que é ser português”.

A advogada receia que, com a aprovação da nova lei, Portugal possa ser usado como trampolim para se aceder ao espaço europeu.

“O que temos apercebido é que há cada vez mais os que pede a nacionalidade portuguesa exclusivamente com uma intenção de benefício não para estar em Portugal, mas para ter acesso a outros países da União Europeia. Isso é algo que, confesso, a mim me incomoda. Mas a minha profissão permite-me ter que ver isso de uma forma diferente”, afirma.

Pelo menos 170 mil pessoas aguardaram a aquisição da nacionalidade portuguesa, um direito que nos últimos dez meses foi atribuído a 102.737 pessoas, segundo dados do Ministério da Justiça, recentemente divulgados pelo Jornal de Notícias.

“Só este ano já houve 151.908 pedidos”, o que corresponde a “uma média de 500 por dia, e que a manter-se até dezembro fará de 2019 o ano com o número mais alto de pedidos da década, superando os 174.624 de 2018”, até porque “há neste momento 171.893 processos à espera”, garante a publicação.

As advogadas ouvidas pelo jornal É@GORA também alertam para a possibilidade de a facilidade que se abre com a nova lei de nacionalidade “naturalmente trazer um acréscimo de trabalho diferente aos advogados”,

Mas, afirma Fabiana Azevedo, “depois vai especar noutro problema que temos em Portugal: nenhum advogado vai ultrapassar”.

É que “cada vez mais os pedidos de nacionalidade vão atrasar, porque nós não temos gente suficiente a trabalhar nos serviços centrais de conservatórias para tramitar este tipo de pedidos, o que leva a outro tipo de problema que é: deveria o governo deixar de centralizar determinados serviços de nacionalidade com exclusiva responsabilidade da competência dos serviços centrais e permitir que outras conservatórias pudessem também tramitar”, sugere.

Aliás, a nova situação vai mesmo ter um impacto para advogados porque, considerou Filipa Braga Ferreira, justificando:
“O que acontece é que as pessoas tentam de alguma forma encaixar-se ou enquadrar-se nalgumas das provisões legais, algo que poderá levar ao aumento da procura dos serviços” dos escritórios de advogados.

Por isso, deveria “haver canais privilegiados para advogados para atendimentos distintos, para atendimento de cidadãos que decidem por si tratar dos seus processos. E depois horários e canais específicos para atendimento dos advogados de forma a tentar agilizar o máximo possível essas situações”, propõe a advogada Filipa Braga Ferreira.

Fabiana Azevedo também propõe uma solução: “Devia haver a possibilidade de a tramitação ser feitas noutras conservatórias – é serviço público na mesma – e passar a final dos processos nos crivos dos serviços centrais. O problema é que os processos são todos tramitados na sua grande maior nos serviços centrais”. (MM)

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