O piscar de olho turístico de “Minas para o Mundo” em plena pandemia

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Apresentação do projeto "Minas para o Mundo" FOTO: Ana Cunha ©

Manuel Matola

Um projeto de internacionalização do turismo brasileiro pretende tornar a cozinha de Minas Gerais num dos “fenómenos turísticos” mais atrativos entre os 26 estados do Brasil onde os sistemas de vacinação são hoje “absurdamente eficientes”.

A capital portuguesa, Lisboa, foi a cidade europeia escolhida para ser o eixo de partida da “abertura pujante” da terceira fase de um plano de “internacionalização da cozinha mineira”. A iniciativa congrega 883 municípios do Estado brasileiro de Minas Gerais cujo propósito é “dar credibilidade ao Brasil neste momento pandémico”.

Desde a eclosão da pandemia no país, em março de 2020, a doença causou mais de 611 mil mortes num universo de quase 22 milhões de pessoas infetadas por coronavírus, segundo dados das autoridades de Saúde do Brasil, a única nação lusófona com mais casos de Covid-19 registados a nível mundial.

Entretanto, há uma narrativa e uma abordagem oficiais no combate à doença que têm sido contestadas globalmente: as do Presidente Jair Bolsonaro que se recusa a vacinar e a usar máscara em público.

Durante quatro dias a cidade de Lisboa foi por isso palco de uma megaoperação de charme da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais para conduzir àquele Estado brasileiro a centralidade do turismo mundial através do projeto “Minas para o Mundo”.

A iniciativa ocorre numa altura em que a Europa está a braços com a 5ª vaga da Covid-19, que leva algumas das grandes cidades europeias a imporem novas restrições, após a cautelosa reabertura da economia nos meses de Verão.

E como Minas Gerais é pelo segundo ano consecutivo o “Estado mais seguro do Brasil para se viver e fazer turismo” e “possui um sistema de vacinação absurdamente eficiente” é de lá que surge o ambicioso projeto de divulgação do potencial turístico específico dos estados e municípios brasileiros diretamente ao público europeu.

A ideia visa “retirar Minas Gerais do contexto todo e fazer o marketing específico da Mineridade”, resumiu o Secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais, Leônidas Oliveira.

Rota Liberdade (Brasil). FOTO: Nityama Macrini ©
Segundo o responsável, neste âmbito, Minas Gerais tem várias iniciativas em carteira: uma delas é a exploração da Via Liberdade, que vai criar uma nova rota turística ao longo da BR-040, que liga o Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás e Brasília, dando acesso a nove patrimónios culturais da humanidade, mais de uma centena de cidades tombadas e 70% do património histórico nacional.

A empresária Maristela Rangel e o marido viram o seu negócio na área do turismo embater contra uma realidade desconhecida quando o Brasil enfrentou a primeira vaga da pandemia em 2020, pouco depois de um ano em que, de resto, o casal teve muito trabalho na área de turismo em São Paulo: 2019.

Num vídeo promocional do Programa Travessia do banco do Itaú, a brasileira conta em minuto e meio como juntamente com o marido se reinventaram com a chegada da e a paralisação da área: o banco ofereceu o apoio ao casal que conseguiu abrir um novo capítulo em suas vidas vendendo kits de sopas.

O brasileiro André Soncin teve um plano bem delineado para vencer em Portugal, mas o seu processo migratório faliu quando a Covid-19 o forçou a regressar apenas com a roupa do corpo ao Brasil, onde hoje é sócio numa empresa de reciclagem em São Paulo.

Leônidas Oliveira cita agora os dados do Ministério da Saúde e os do Ministério da Justiça do Brasil para ilustrar que “São Paulo, com 45 milhões de habitantes, não teve nenhum caso de Covid-19” no dia 09 de novembro e no mesmo dia Minas Gerais registou “a menor taxa de mortalidade no país, uma das menores do mundo”.

Embora a situação pandémica volte ao normal nos diferentes estados brasileiros, essa não é a visão de quem está fora do Brasil, sobretudo, por causa do posicionamento do chefe de Estado brasileiro divulgado além fronteira. A esse propósito, Leônidas Oliveira é perentório: “a ´media` é muito complexa”.

Questionado pelo jornal É@GORA se há necessidade de se apostar numa nova narrativa para contrariar à forma como Jair Bolsonaro aborda a questão da Covid-19, o Secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais responde.

“O Presidente da República tem as questões políticas que nós vivemos neste momento de antagonismos profundos, mas o Brasil é muito mais profundo, mais forte e mais coeso do que isso tudo”.

Coesão essa que impele os municípios de Minas Gerais a apostarem num projeto único cuja visão, meta e objetivos estão bem delineados para obter resultados dentro e fora do Brasil.

“A meta é muito simples: até dezembro, atrair turistas e gerar empregos. A meta é atrair 100 mil empregos. Em três meses [do projeto] chegamos a 12,5 mil empregos criados pelo Estado. Temos 883 municípios, alguns dos quais têm 200 cachoeiras preservadas”, diz Leônidas Oliveira, para quem a rampa de lançamento dá como garantida o novo ímpeto do turismo brasileiro.

De resto o projeto é ambicioso: “Temos circuitos hoje de 150 milhões de reais disponíveis para pegada de turismo, com juros de 5% ao ano, o que no Brasil é uma coisa inesperada, e com 24 meses para pagar”, frisa o responsável.

Maristela Valadares, presidente do Instituto Realidade Brasil. FOTO: Ana Cunha
A Presidente do Instituto Realidade Brasil, Maristela Valadares, considera por isso que “é de fundamental importância dar credibilidade ao Brasil neste momento pandémico”, até porque hoje, acrescenta Leônidas Oliveira, “os dados sobre a segurança sanitária e a segurança pessoal são os melhores do país”.

Em declarações em Lisboa, a ex-jornalista Maristela Valadares, que impulsionou a missão da delegação mineira a Portugal, aponta o modelo mexicano como um dos que poderia servir de base para a implementação desta iniciativa promovida pela Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais.

Com dois milhões de pessoas por mês atualmente a fazer turismo naquele Estado que alocou 3,6 mil milhões de reais na economia, entre junho e agosto, o Estado de Minas Gerais possui cada vez mais uma maior centralidade nas políticas públicas de turismo no Brasil.

Na base está o potencial turístico da região mineira, destaca Leônidas Oliveira: Minas Gerais tem o “maior número de patrimónios históricos mundiais: quatro ao todo”, possui “62% do património histórico tombado” e conta “também com milhares de cachoeiras”.

E, “de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Estatísticas, de maio até agosto, crescemos 10%, o dobro da média nacional”, aliás, “é a primeira vez que nós conseguimos bater destinos tradicionais como cidades do Rio de Janeiro e São Paulo”, assegura o Secretário apontando outras etapas que a sua entidade pretende atingir em breve para relançar o Brasil a nível global através do projeto turístico “Minas para o Mundo”.

“Crescemos em torno de 100 mil entradas a mais de junho 2019 a junho de 2021, em pandemia, no aeroporto (local) batendo todos os record” de um projeto que segue entrelaçado entre uma perspetiva local – com o arranque do “Minas para Minas”, seguido de “Minas para o Brasil”, onde “foram alocados 10 milhões de reais” num programa que denominado “Reviva Turismo”, lançado em maio -, e uma visão global visando desenvolver a terceira fase do “Minas para o Mundo” através de Portugal enquanto “porta de entrada do Brasil na Europa”.

Leônidas Oliveira, Secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais. FOTO: Ana Cunha ©
Leônidas Oliveira justifica a escolha: “Faz muito sentido estar em Portugal [pois] além das confluências históricas e culturais muito fecundas (…) hoje em dia o turismo de moradia cresce vertiginosamente. Muito [por conta] da classe média e alta brasileira [que] têm como desejo mudar para Portugal”, dado que o país “nos últimos anos vive um fenómeno que é paradigma de reinvenção turística. [Daí que] nos interessa muito beber da fonte”.

Mas todo “este arcabouço” tem fatores muito mais importantes e uma perspetiva replicadora do negócio que se estende por França, Estados Unidos da América e pela própria América Latina.

No dia 28 vamos, a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais vai escalar França numa missão de negócio a convite do governo francês, visto que quer os franceses quer os portugueses ocupam hoje as primeiras duas posições no ranking de turistas que anualmente escalam aquele Estado brasileiro onde se localizam três das cidades mais acolhedoras do mundo.

E mais: há uma perspetiva de inclusão dos estados lusófonos neste projeto, daí que no âmbito da missão a Lisboa houve assinatura de um protocolo de intenções entre a Fundação de Arte de Ouro Preto (Faop), vinculada à Secretaria de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais, e o Instituto de Formação dos Países de Língua Oficial Portuguesa (IF/CE-CPLP), no sentido de desenvolver ações de formação conjuntas, especialmente no campo da cultura, que contará com parceria de outras instituições afins.

A perspetiva global de promoção do turismo brasileiro por via da cozinha mineira passa igualmente por desenvolver uma outra iniciativa de cariz político nacional também em prol de toda a diáspora brasileira: a comemoração do Bicentenário da independência do Brasil, agendada para o próximo ano. (MM)

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