Os pedidos de asilo em Portugal e o fluxo dos requerentes na Europa

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O Observatório das Migrações diz que há um forte incremento de requerentes de asilo

Manuel Matola

Portugal continua a ser um dos palcos privilegiados para jovens abaixo de 35 anos, incluindo mulheres, que requerem asilo no espaço europeu, indica o Relatório Estatístico do Asilo 2020 sobre a nova realidade migratória de pessoas deslocadas contra a sua vontade, que atingiu nos últimos cinco anos “valores inéditos no mundo”.

Um estudo sobre a Entrada, Acolhimento e Integração de Requerentes e Beneficiários de Proteção Internacional em Portugal, coordenado pela socióloga portuguesa Catarina Reis Oliveira, responsável pelo Observatório das Migrações, dá conta de que jovens de Angola e Guiné-Bissau são os únicos cidadãos oriundos do espaço lusófono que integram a lista das “cinco nacionalidades numericamente mais expressivas” que solicitaram pedidos de proteção internacional no país, no último ano.

“Em 2019, em Portugal, as cinco nacionalidades numericamente mais expressivas (Angola, Gâmbia, Guiné-Bissau, Guiné e Venezuela) representaram, no seu conjunto, 47,3% do total de pedidos de proteção internacional no país, quando no contexto geral da UE28 essas mesmas nacionalidades não representaram mais de 9,2%”, indica o estudo a que o jornal É@GORA teve acesso.

A nível dos 28 Estados-membros da organização Comunitária, tanto em 2018 como em 2019, os sírios representaram o maior grupo de requerentes de proteção internacional, numa lista que integra outras quatro nacionalidades: afegã, venezuelana, iraquiana e colombiana.

Os pedidos feitos pelos sírios representam 12,9% do total dos pedidos, ou seja, 83.745 requerentes em 2018, e 10,9% ou 78.545 em 2019, sendo que um pouco mais de metade destes requerentes estava na Alemanha.

Depois da Síria, seguiram-se os nacionais do Afeganistão (7,1% ou 45.995 requerentes em 2018 e 8,2% ou 59.150 em 2019) e do Iraque (6,9% ou 44.835 requerentes em 2018 e 4,9% ou 35.170 em 2019).

Em 2019 os venezuelanos passam para a terceira nacionalidade mais representada no universo global de requerentes da UE28 (6,3% ou 45.400 requerentes), quando em 2018 estavam na sétima posição (3,5% ou 22.450 requerentes nesse ano, dos quais 19 mil estavam em Espanha).

A quinta nacionalidade mais representada em 2019 foi a colombiana (4,5% ou 32.300 requerentes), tendo as cinco principais nacionalidades representado, no seu conjunto, nesse ano, 35% do universo geral de requerentes de proteção internacional na UE28.

Contudo essas mesmas cinco nacionalidades (síria, afegã, venezuelana, iraquiana e colombiana), em 2019, não representaram mais de 8% do total de pedidos de proteção internacional em Portugal.

“Demonstra-se, assim, que a realidade do asilo é distinta de país para país da União Europeia, identificando-se que determinadas nacionalidades tendem a procurar mais alguns Estados-membros que outras, podendo refletir redes sociais ou familiares anteriormente estabelecidas, ou o efeito de características culturais específicas do país europeu de acolhimento, tais como a língua e relações históricas”, explica o estudo.

Reconhecendo que “o volume de pessoas deslocadas contra a sua vontade atingiu nos últimos cinco anos valores inéditos no mundo, com muito rápida evolução, em consequência de guerras, conflitos armados ou violação dos direitos humanos”, o primeiro relatório estatístico do asilo, que tem como período de referência os anos 2014 e 2019, assinala que “Portugal não esteve alheio a esta nova realidade migratória”.

FOTO: DR/Arquivo
Nos últimos cinco anos, as autoridades portuguesas concederam o estatuto de refugiado e de proteção subsidiária a 1.327 pessoas, um “aumento expressivo”se comparado ao anos 2010 e 2014, período em que o direito a ser refugiado foi atribuído“a um total de 82 pessoas (nunca ultrapassando as 20 concessões por ano)”.

Se, entre 2010 e 2014 foi assim, entre 2015 e 2019, a autorização de residência de beneficiários de proteção subsidiária foi concedida “a 380 pessoas, passando esses números para 724 e 1.327 concessões, respetivamente, nos cinco anos seguintes”.

“A análise da repartição etária dos requerentes de asilo por país da UE28 também faz destacar diferenças entre a população que cada Estado-membro recebe: em 2018 e 2019, os requerentes de asilo com menos de 13 anos de idade representavam cerca de um quarto (24%) do total de requerentes da UE28; os requerentes com entre 14 e 17 anos representavam 6% em 2018 e 5% em 2019; identificando-se que quase metade dos requerentes tinha entre 18 e 34 anos de idade (48% em 2018 e 2019) e os com mais de 35 anos representavam perto de um quarto do total de requerentes de asilo (21% em 2018 e 22% em 2019)”, lê-se no documento.

Deste modo, sublinha o estudo do Observatório das Migrações de Portugal, “quase quatro em cada cinco requerentes de asilo no espaço europeu tinha menos de 35 anos de idade e quase um terço do número total de pedidos de proteção internacional era constituído por menores de 18 ano”.

Em Portugal, em 2018, “os requerentes com menos de 13 anos representavam 18% do total de pedidos de asilo processados no país, passando para 13% em 2019; os pedidos de requerentes com entre 14 e 17 anos representaram 6% em 2018 e 5% em 2019; os requerentes de asilo com entre 18 e 34 anos representaram 53% em 2018 e 59% em 2019 (+11pp que o verificado na UE28); e finamente os requerentes com mais de 35 anos de idade apresentaram uma importância relativa de 23% em 2018 e 22% em 2019, sendo praticamente inexistente pedidos de requerentes com 65 e mais anos de idade”,destaca o relatório.

Menores

FOTO: Reuters ©
De acordo com o Observatório das Migrações, há menores estrangeiros não acompanhados na lista dos que necessitam de proteção internacional nos 28 estados membros da União Europeia, aliás, segundo o relatório, “nos últimos anos aumentaram substantivamente” os pedidos nesse sentido.

“Em 2011 havia registo de 11.695 menores estrangeiros não acompanhados no espaço europeu, subindo esse valor para 95.215 em 2015, ano em que atinge o valor mais elevado”, garante o estudo.

Mas, em 2016, estes números desceram para 63.260, reduzindo ainda para 31.410 em 2017 e para 19.850 em 2018, representando nesse ano 10% do total de requerentes de proteção internacional com menos de 18 anos na UE28.

“Em 2018,os pedidos de proteção internacional de menores não acompanhados em Portugal não representam mais de 0,2% do total de menores não acompanhados que se encontravam na UE28, e significaram 13,1% do total de pedidos de proteção de menores no país. Embora os menores estrangeiros não acompanhados sejam ainda uma realidade menos expressiva em Portugal, verifica-se que, nos últimos anos, aumentaram os pedidos de proteção de menores estrangeiros não acompanhados (de 17 pedidos em 2014, passam a 46 pedidos em 2019”.

No entanto, o Observatório das Migrações assinala que”o número de refugiados, de requerentes de asilo e de populações deslocadas no seu próprio território conheceu um forte incremento nos últimos anos no mundo, tendo atingido um máximo histórico em 2018, quando ultrapassou os 70 milhões, e que contrastou com a evolução da década anterior (até 2012 esse número nunca tinha ido além dos 45 milhões de pessoas).

Em Portugal, há quatro situações que dão direito a que um estrangeiro seja beneficiário de protecção internacional.

A concessão do direito de asilo (1) “é garantido aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de atividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana”.

Também (2) “têm ainda direito à concessão de asilo os estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento ser perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual”.

A terceira condição para a concessão do direito de asilo prende-se com o o facto de estrangeiro ter “mais de uma nacionalidade quando os motivos de perseguição referidos nos números anteriores se verifiquem relativamente a todos os Estados de que seja nacional”.

E a última (4): “Para efeitos do n.º 2, é irrelevante que o requerente possua efetivamente a característica associada à raça, religião, nacionalidade, grupo social ou político que induz a perseguição, desde que tal característica lhe seja atribuída pelo agente da perseguição”, indica a Lei n.º 27/2008, que estabelece estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária e os estatutos de requerente de asilo, de refugiado e de proteção subsidiária. (MM)

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