
Manuel Matola
A cabeça de lista do Somos Todos Lisboa à Câmara da capital portuguesa, Ossanda Liber, organizou este domingo um jantar-comício com uma centena de pessoas onde assegurou que “o fim [do movimento cívico] não será estas eleições, independentemente dos resultados” de uma candidatura que “está aberta a todos, indiscriminadamente”.
Ao jornal É@GORA, nesta segunda-feira, a candidata de nacionalidade angolana e francesa admite a inflexão que a sua equipa teve que fazer ao preparar um programa que começou por pretender “dar voz à imigração”, mas depois “passou a ser mais amplo”.
Hoje, a lista encabeçada por Ossanda Liber para as eleições autárquicas é para “todos os lisboetas, independentemente da sua origem, das suas caraterísticas, sua condição financeira”, até porque o grupo independente decidiu que o movimento seria “pela inclusão de todas os lisboetas que sentissem a necessidade de ter voz”.
Deste exercício, surgem dois artistas para ecoar a voz dos lisboetas: o angolano Bonga, o cabeça de cartaz do “show”, que pela primeira vez faz uma confissão enigmática para quem sempre procurou estar alheio às questões políticas partidárias, isso depois de anos a ser hostilizado pelas autoridades angolanos do período monopartidário supostamente por ser ideologicamente próximo do partido do Galo Negro, a UNITA.
De São Tomé e Príncipe, o músico Tonecas Prazeres, que há quase 40 anos vem trilhando vários palcos musicais em Lisboa, onde reside, assumiu uma função política no movimento cívico, a de delegado político. E, no domingo, pisou o estrado numa dupla condição antes do breve discurso que marcou a noite de campanha eleitoral.
Dirigindo-se aos presentes, a candidata luso-angolana defendeu a “integração, a igualdade e o amor à cidade” como base de trabalho do movimento independente e procurou demarcar-se sobretudo dos seus principais opositores políticos que na corrida e nas sondagens à presidência de Lisboa são colocados na ordem seguinte: Fernando Medina (PS-Livre), Carlos Moeda (PSD) e Beatriz Gomes Dias (BE).
“Este projeto surge pela constatação de que a política está cada vez mais distanciada dos cidadãos e o objetivo é reaproximar a política dos lisboetas, indo ao encontro das reais necessidades e expectativas dos lisboetas”, assegurou Ossanda Liber, empresária e analista política, de 43 anos, que, depois de anos a residir entre Angola e França, decidiu passar a viver em Portugal, em 2004.
“Mesmo que tenha que repetir tantas vezes, irei dizer o quanto gosto desta cidade”, disse a cabeça de lista do Somos Todos Lisboa, cuja candidatura obedece a um “princípio fundamental”: o “da inclusão”, segundo vem plasmado em duas brochuras espalhadas ao lado dos talhares pelas mesas onde se sentaram os convidados no jantar-comício.
E neste manifesto eleitoral distribuídos pelos presentes em folhetos, Ossanda Liber resume o essencial da sua visão da cidade capital que acompanha as conversas no jantar-comício que durou quase seis horas.
“Felizmente a consciência pelo nascimento deste movimento que designamos ´Somos Todos Lisboa` recai no princípio de que só há desenvolvimento humano pleno quando os valores da inclusão, da igualdade plena, da não discriminação, do ´combate` à exclusão, constituem de facto pontes para que todos os habitantes de uma cidade possam sentir-se parte da mesma sem qualquer sentimento de discriminação”, lê-se na brochura.
Em entrevista ao jornal É@GORA esta segunda-feira, Ossanda Liber aponta para outras prioridades, apesar de manter a centralidade das questões migratórias na sua campanha e no seu projeto político.
“Inicialmente, quando decidimos ir à rua auscultar e perceber a pertinência das nossas ideias para que preparássemos o programa, o plano era dar voz à imigração. Julgávamos que era o setor da sociedade lisboeta que mais necessitava e mais urgente de intervir. Até pelas minhas próprias caraterísticas e de alguns dos nossos candidatos que integram a lista, obviamente, temos sensibilidade para este tema”, diz.
Mas do contacto com os munícipes, surge uma verdade inesperada: “Quando chegamos à rua apercebemo-nos que não eram só imigrantes que se sentiam excluídos pela freguesia, nalguns casos, e pela autarquia, noutros casos. Decidimos então ampliar o âmbito, mas sem nunca tirar a atenção do nosso objetivo inicial”: os imigrantes.
E, após fazer-se “um diagnóstico dos vários problemas da imigração”, a equipa pôde apresentar “propostas e medidas muito concretas”. Exemplo: primeiro, a de criação de uma plataforma eletrónica informativa que ajude à integração dos imigrantes.
“Queremos criar esta plataforma para que mesmo antes de chegarem a Portugal as pessoas saibam como se devem legalizar”, resume Ossanda Liber, reconhecendo haver “aqui uma falta de informação que começa logo por colocar os imigrantes numa situação de dificuldade” junto ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Do projeto político de Ossanda Liber retiram-se outras prioridades que refletem os tempos atuais que se vivem també nesta cidade que, à passos galopantes da recuperação da pandemia, em termos de vacinação, viu a Covid-19 deixar fortes resquícios a nível psicológico de muitos munícipes afetados pelo desemprego.
E, segundo indica o programa político, a “inclusão” desta vítimas passa por “permitir que todos os lisboetas tenham acesso equitativo e gratuito de apoio psicológico, seja através de postos de atendimentos móveis, seja do reforço de psicológico nas 24 freguesias existentes”.
E neste exercício que visa à “igualdade entre os lisboetas”, a candidata do movimento político Somos Todos Lisboa defende um investimento “em equipamentos municipais nos bairros considerados de habitação social e todos os que necessitam”, bem como a necessidade de “oferecer condições atrativas de investimento privado nos bairros recentemente criados que beneficiem moradores e futuros compradores”.
A descentralização da habitação e a criação de “polos rendas comportáveis”, o fomento do desporto para todas as faixas etárias são outras das apostas da candidatura de Ossanda Liber, que quer incentivar o acesso do jovens com 18 anos à cultura e leitura através da distribuição de “cheques cultura” para aquisição de livros, bilhetes para teatro e museus.
Antes de materializar estes objetivos, a candidata angolana resumiu aquilo que é o propósito da iniciativa Somos Todos Lisboa numa breve intervenção num comício que marcou a noite eleitoral cruzando o fado e a música africana: a necessidade de “humanizar” a capital portuguesa. (MM)