O Parlamento português aprovou uma proposta legislativa que altera as regras de atribuição dos Vistos Gold: futuramente, a concessão deste tipo de visto – oficialmente designado Regime das Autorizações de Residência para Investimento – estará limitada aos municípios do interior ou das regiões autónomas dos Açores e da Madeira, sendo que nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, ou em cidades do litoral do país, os vistos serão atribuídos apenas a investidores que criem postos de trabalho, por exemplo, através do lançamento de empresas.
A limitação da concessão dos Vistos Gold aos investimentos imobiliários em municípios do interior ou das regiões autónomas dos Açores e da Madeira foi hoje aprovada, na discussão na especialidade do Orçamento do Estado 2020.
Em causa está uma proposta de autorização legislativa sobre o Regime das Autorizações de Residência para Investimento (habitualmente designado de Vistos Gold) apresentada pelo PS, que reuniu os votos a favor do PS e PSD e os votos contra do BE e PAN que viram as respetivas propostas sobre o fim dos ‘vistos gold’ serem chumbadas.
A medida pretende “favorecer a promoção do investimento nas regiões de baixa densidade, bem como o investimento na requalificação urbana, no património cultural, nas atividades de alto valor ambiental ou social, no investimento produtivo e na criação de emprego”, propondo, para tal, restringir ao território das Comunidades Intermunicipais (CIM) do Interior e das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira os investimentos em imobiliário com vista à obtenção de uma autorização de residência, e aumentar o valor mínimo dos investimentos e do número de postos de trabalho a criar.
Em simultâneo pretende-se aliviar a pressão do mercado imobiliário em zonas como Lisboa e Porto, acabando com a possibilidade de obtenção de um “visto Gold” através de investimento em imobiliário nestas zonas e nas CIM do Litoral.
Contudo, a proposta não prejudica a possibilidade de renovação das autorizações de residência concedidas ao abrigo do regime atualmente em vigor, nem a possibilidade de concessão ou renovação de autorizações de residência para reagrupamento familiar previstas na lei, quando a autorização de residência para investimento tenha sido concedida ao abrigo do regime atual.
Esta autorização legislativa tem a duração do ano a que corresponde o OE2020.”Com esta medida, procuramos retirar a pressão [no mercado imobiliário] existentes nas áreas metropolitanas [de Lisboa e do Porto]. Esta nossa medida contribuirá para a uma maior coesão territorial”, defendeu a líder da bancada dos socialistas, Ana Catarina Mendes, quando a iniciativa foi apresentada com mais detalhe.
O fim dos “vistos Gold” para estrangeiros de países terceiros à União Europeia que invistam 500 mil euros em Portugal, designadamente no mercado imobiliário, tem sido insistentemente reclamado por associações ligadas ao combate ao branqueamento de capitais e por partido, sobretudo o Bloco de Esquerda.
Em entrevista recente ao jornal É@GORA, a vice-presidente da Transparência e Integridade, Susana Coroado, explicou o quais os problemas em relação aos vistos Gold na Europa.
“É que são vários os países que têm esses programas. Então, quando um candidato não consegue num país tenta o seguinte: ou porque um país é mais barato, ou porque as regras são mais fáceis. Às vezes, há casos de candidatos que foram rejeitados num país e aceite noutro. Atendendo que é uma forma de captar investimento – nós reconhecemos isso -, mas também reconhecemos que comporta muitos riscos, pelo que tem que haver várias regras comuns e harmonizadas. É necessário que haja um controlo muito maior a nível de procedimentos dos países e de procedimentos de controlo de cada candidato”.
“Portanto”, assinalou Susana Coroado, “aquilo que nós sugerimos de imediato aqui em Portugal é que se faça um estudo do real impacto que o programa dos vistos Gold tem para compreender se de facto vale a pena manter um programa que acarreta tantos riscos e tantas consequências sociais. Que se faça ou se torne público um manual de procedimentos internos com garantias de que todas as regras de controlo e branqueamentos de capitais são asseguradas. E, no entretanto, enquanto isso não é feito que haja, à semelhança do que já aconteceu noutros países, que haja uma suspensão imediata dos programas dos vistos Gold”.
Questionada se essa harmonização não devia ser também da União Europeia, a vice-presidente da ONG vocacionada na luta anti-corrupção disse:
“A questão é que, durante muito tempo, a União Europeia recusou-se envolver-se a comentar esse assunto porque isso tem a ver com a política de imigração, que é matéria restrita aos Estados-membros. Não é uma política europeia. São os Estados membros que decidem a quem dão cidadania e autorização de residência”.
De acordo com a responsável, “nos últimos anos, precisamente porque estes programas, no fundo, estão a vender o acesso ao espaço Schengen, pessoas que fazem investimentos em Portugal obter os vistos Gold, ou em Malta, ou Chipre não estão a comprar a residência nesses países. Estão a comprar o acesso livre ao espaço Schengen, de tal forma que nas agências que fazem promoção destes programas é precisamente isso que têm como slogan: dão acesso ao espaço Schengen”.
“Nessa medida”, afirmou, “a União Europeia já começou a ter preocupações, porque o espaço Schengen é uma questão comunitária, bem como o branqueamento de capitais. Portanto, as coisas estão a alterar-se, só que, de facto, há aqui duas dimensões que se opõem: dimensão europeia e dimensão de política nacional”.
De acordo com as estatísticas do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), até novembro, os vistos Gold captaram investimentos na ordem dos 37 milhões de euros, depois de no período homólogo de 2018 ter arrecadado 77,1 milhões de euros. (Redação e Lusa)