Protesto/Habitação: Gislene é brasileira e vive num Hostel porque não consegue arrendar

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Lisboa, uma das cidades europeias de maior atração de imigrantes

Manuel Matola

A imigrante brasileira Gislene vive num Hostel não porque esteja numa situação financeiramente confortável, mas por não conseguir arrendar uma casa em Portugal, onde os critérios impostos aos imigrantes diferem parcialmente da lógica de contrato de arrendamento normal que é exigido a um português.

Se a um cidadão nacional os senhorios geralmente pedem um mês de renda, uma caução e um fiador como garantias para um contrato escrito, à Gislene e a tantos imigrantes espalhados pelo país, há quem exija de imediato vários meses de rendas adiantadas, um fiador – preferencialmente português -, além de procurar saber o seu contexto histórico familiar que por vezes está relacionado com o perfil comportamental dos filhos.

Um ano depois de passar a residir legalmente em Portugal, o brasileiro Elivelto viu-se aflito para encontrar uma casa em Leiria onde teve “um pouco de dificuldade” para acolher a mulher e o filho exatamente porque a proprietária do apartamento que o imigrante queria achou que o filho menor seria “uma criança bagunceira”.

Elivelto acabou por não conseguir a casa na sua primeira experiência para arrendar um espaço para morar com a sua família, após um ano a partilhar uma casa anterior com um irmão que já mora em Portugal, onde, este sábado, milhares de pessoas saíram à rua para participar na manifestação contra a crise na habitação.

O processo de rejeição da proposta de arrendamento foi estratégico da parte da dona do imóvel. Na altura, Elivelto viu o anúncio da casa numa página “de classificados” de um jornal. Ao entrar em contacto com a proprietária, a conversa fluiu para quase um sim, até que teve de responder várias questões que mudaram o curso da negociação.

“A senhoria perguntou se eu tinha criança. Eu disse que sim. Ela perguntou a idade da criança, respondi, se a criança era quieta ou não, se era bagunceira. Aí então eu disse que a criança era quieta”, conta o imigrante num depoimento enviado ao jornal É@GORA.

Ainda assim, a proprietária disse que já estava arrendada, já tinha alguém para a ocupar.

Elivelto não tem dúvidas:”A senhoria mentiu” porque não queria [uma família com] crianças na sua casa.

De forma astuta, o imigrante brasileiro contrapôs o argumento adotando uma estratégia diferente.

É que a estratégia de promoção que a proprietária da casa adorou foi também o de passa a palavra.

“Ela já tinha falado com um colega meu”, mas desconhecia essa relação de amizade entre ambos.

“Por coincidência”, conta o brasileiro, o seu amigo deu o mesmo contacto da senhoria, ao que Elivelto ligou de novo.

“Ela perguntou e eu disse que era a pessoa que tinha ligado antes”.

A estratégia surtiu efeito, mas foi sol de pouca dura. A proprietária elevou a fasquia das exigências escalando para a parte financeira.

“Na altura, o meu colega que tinha saído da casa pagava 270 euros. Quando a senhoria foi falar comigo ela já queria que eu pagasse 320 euros e sem contrato de arrendamento”, relata Elivelto que, desta vez, ficou sem margem para contrapor.

Se por um lado a renda era elevada para a realidade local, por outro havia um risco a correr: não ter contrato quando o objetivo do imigrante Elivelto que se viu aflito para encontrar uma casa era o de acolher a mulher e o filho no âmbito do reagrupamento familiar, um processo exigente, que embora ande aos solavancos, é rígido num ponto: exige contrato de arrendamento.

Quem casa quer casa.

É a situação da brasileira Gislene que “está na luta por encontrar” uma casa.

Até lá, vai morando em Hostel até que apareça um senhorio que apenas siga as regras de arrendamento que oficialmente vigoram no território português: uma renda, uma caução e um fiador para fechar o negócio com contrato de arrendamento como a de milhares de portugueses que hoje saíram à rua para participar na manifestação contra a crise na habitação, mas com uma exigência diferente: uma versão melhorada do projeto Mais Habitação recentemente aprovada pelo governo, mas contestada pela maioria dos portugueses. (MM)

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