Manuel Matola
O ministro português da Administração Interna, José Luís Carneiro, deu hoje a conhecer alguns pormenores do processo de transição de competências e atribuições do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para a GNR e a PSP, destacando “o papel decisivo” que a Polícia de Segurança Pública (PSP) vai ter no trabalho que será feito no âmbito do controlo da permanência e atividade dos imigrantes em Portugal.
Falando num ciclo de conferências, José Luís Carneiro considerou que o encontro de dois dias – 27 e 28 de setembro – constitui um “primeiro evento de reflexão sobre aquele que será o desafio mais importante para o ano de 2024 da PSP”, que “é garantir com tranquilidade a transição da arquitetura do SEF, na medida em que a PSP vai ter um papel decisivo, nomeadamente, naquele que é o espaço de maior pressão que é o espaço aéreo, onde se sente maior necessidade de controlo de cidadãos de países terceiros”.
Há uma razão para isso: Portugal só tem uma fronteira terrestre com a Espanha, sendo que as entradas ao país e as saídas do território português são feitas quase na totalidade por via aérea. Nesse sentido, “a PSP, que tem hoje mais de 20 mil elementos, assume a responsabilidade pelo controlo da fronteira aérea”, disse o ministro da Administração Interna que, entretanto, avisou: no global, “a Segurança nas fronteiras será reforçada” com o fim do SEF.
José Luís Carneiro desvendou alguns dados sobre a reestruturação do órgão responsável pela legalização dos imigrantes e reafirmou o compromisso já assumido pelas autoridades portuguesas relacionada à extinção do SEF: o processo terá como “ponto referência o dia 29 de outubro” e “a partir” desta “data em que entram em vigor os Decretos-Lei n.ºs 40/2023 e 41/2023, ambos de 2 de junho”, arrancam a transição de trabalhadores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
“Há longos meses que a PSP e a GNR estão com o SEF nas fronteiras, num processo de cooperação que aumenta a capacidade de controlo dos que entram e saem do país e, ao mesmo tempo, permite uma contínua e salutar troca de experiências, que se refletirá positivamente no futuro. Dentro do esforço de capacitação, foram já ministrados cursos na área do controlo fronteiriço a 348 elementos da PSP, estando atualmente outros 50 polícias em fase formativa. Também frequentaram esses cursos 235 militares da GNR, na vertente teórica e prática dessas ações formativas ministradas pelo SEF”, afirmou o governante na abertura do evento que decorre desde hoje e que é repleto de discussões em diferentes painéis compostos por quase toda a estrutura de topo dos serviços migratórios e de segurança nacional.
Logo pela manhã, o ministro da Administração Interna presidiu à abertura do ciclo de conferências sobre a transição de competências e atribuições do SEF. A intervenção de José Luís Carneiro foi precedida da de Paulo Viseu Pinheiro, Secretário Geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), órgão a quem fica alocada uma parte das competências no âmbito da reestruturação do SEF, ou seja, vai ser responsável pela Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros.
Numa entrevista recente ao DN, Paulo Viseu Pinheiro disse como está a ser preparada a transição para a nova agência da imigração e deixou garantias de que “no SEF nada se perde, tudo se transforma”.
Quando questionado se a sociedade deve estar preocupada, ou não, com a dispersão de competências que poderá eventualmente aumentar os riscos ligados a algumas situações, como a imigração irregular, ou tráfico de pessoas, Paulo Viseu Pinheiro esclareceu: Não há dispersão (de competências), há uma concentração de competências”.
E ilustrou: “Por exemplo, o tráfico de seres humanos, a imigração ilegal, os crimes conexos com a imigração ilegal, eram trabalhados, investigados, eram atribuídos ao SEF e à Polícia Judiciária. Havia duas entidades que faziam a parte, digamos, criminal, mas agora passa a ser tudo Polícia Judiciária. Portanto, agora, há uma concentração de meios e diria que há quase uma multiplicação de meios na área de investigação criminal. Daí, aliás, a solução da transição em bloco dos inspetores e dos investigadores do SEF para a Polícia Judiciária tem também este sentido de concentração de meios e otimização de meios”.
Paulo Viseu Pinheiro acrescentou: “Depois, na parte das inspeções nas fronteiras, obviamente que a PSP e a GNR vão dar dimensão e profundidade a essas zonas de fronteiras. Aliás, é preciso não esquecer que até a criação do SEF, que se não estou em erro foi em 1986, quem estava nas fronteiras em Portugal era a PSP, nas fronteiras aéreas, e a GNR estava nas fronteiras terrestres. Mas as forças policiais, a PSP e a GNR, têm tido formação dada pelo SEF, formação de especialização na área de controlo de qualidade do controle fronteiriço. Obviamente que estão no training on the spot, ainda estão a receber treino muito especializado que os quadros superiores do SEF têm vindo a dar, têm vindo a prestar, e, portanto, acho que Portugal ganhou uma nova dimensão, uma nova competência na gestão integrada das fronteiras e que essa gestão, devo dizer, já tem sinais de interesse da Comissão Europeia e de outros países europeus, quanto ao modelo português”.
Uma das formas de fazer frente às eventuais dificuldades será a introdução das chamadas “Fronteiras Inteligentes”. Em 2013, no âmbito da política de controlo da fronteira externa da União Europeia (UE), Bruxelas aprovou um pacote legislativo com essa designação. Trata-se, na verdade, de um sistema de registo automatizado de entrada e saída de cidadãos estrangeiros e é composto por um programa de passageiro frequente.
Os contornos dessas “Fronteiras Inteligentes” foram dados a conhecer pela inspetora Erica Santos, responsável pela operacionalização do Sistema de Entrada/Saída (EES), o SEF Mobile, uma ferramenta que surgiu para dar resposta ao controlo fronteiriço terrestre no período da Covid-19. Logo no início da pandemia, o SEF usou o aplicativo tendo realizado, em apenas um mês, mais de 75 mil controlos de fronteira, de forma eficiente e sem recorrer a qualquer contacto físico com os cidadãos que atravessaram os limites fronteiriços entre Portugal e Espanha.
A inspetora Erica Santos partilhou o painel com o inspetor do SEF Alexandre Elias, que destacou o Sistema Europeu de Informação e Autorização da Viagem (ETIAS), em resposta aos novos desafios no controlo documental nas fronteiras da União Europeia.
A propósito destas “grandes questões”, como por exemplo, as das “Fronteiras Inteligentes”, da gestão integrada de fronteiras, a FRONTEX ou a cooperação europeia, entre um vasto conjunto de temas que irão ser aprofundadas neste ciclo de conferências, o ministro lembrou que “há hoje imperativos políticos essenciais ao projeto europeu: manter e reforçar o Espaço Schengen enquanto espaço de liberdade, segurança e justiça”.
E é no quadro desses imperativos que “ao mesmo tempo que se coloca a necessidade de fazer face ao desafio demográfico europeu”, ou seja, “dar resposta eficaz a todos quantos procuram a União Europeia como projeto de vida e Portugal como destino”, disse o titular da pasta da Administração Interna. (MM)