“Tenho medo de ser deportado” – Fabiano, um imigrante já desprovido de MI e sem Residência CPLP

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Manuel Matola

O imigrante Fabiano Elias vive numa ansiedade diária por medo de ser deportado para o Brasil caso volte a pisar o solo português, onde já esteve numa situação regular e hoje nem sequer sabe se tem os plenos direitos de residência.

Após aderir ao processo de solicitação da nova autorização de residência automática CPLP destinada aos cidadãos lusófonos, o jovem brasileiro viu “sumir” da página do SEF todas as informações referentes à sua Manifestação de Interesse solicitada em novembro de 2022 quando chegou a Portugal e teve o documento que, na altura, o permitiu arranjar trabalho.

“Tenho a minha manifestação de interesse impressa, mas tenho medo de chegar aí [em Portugal] e me deportarem”, diz Fabiano Elias, numa conversa telefónica com o jornal É@GORA, a partir do Brasil onde está a passar umas férias forçadas depois de ter perdido emprego em Portugal. Volvidos dois meses, o imigrante continua a aguardar a análise que o SEF está a fazer ao seu processo que submeteu após o órgão introduzir a 13 de março o novo sistema de legalização dos imigrantes em Portugal.

A espera de Fabiano Elias vai longa, tal como a de Bruna Souza cujo filho de 8 anos há exatamente dois meses precisa de um médico pediatra especial, mas não consegue dar sequência ao pedido por falta de um documento que lhe confere os mesmo direitos que tem qualquer cidadão que viva legalmente em Portugal.

À semelhança da brasileira Bruna Souza, que pediu ajuda à câmara para resolver o seu caso, a decisão de Fabiano Elias foi tomada após acompanhar atentamente pela imprensa as recomendações que têm sido deixadas pelas autoridades migratórias portuguesas, nomeadamente na voz do ministro da Administração Interna, José Carneiro, que no dia 11 de março apelou aos imigrantes com processos pendentes no SEF para aproveitarem este novo regime de regularização.

“É assim muito importante que os cidadãos imigrantes dos países da CPLP aproveitem esta oportunidade para regularizar a sua situação”, disse em março o gabinete da Administração Interna de Portugal sobre a regulação dos imigrantes lusófonos com direito à autorização de residência CPLP.

Numa nota emitida a 22 de março, o Ministério da Administração Interna assinalava que, além desses requerentes, que já residem em Portugal, os cidadãos portadores dos novos vistos consulares CPLP emitidos após 31 de outubro de 2022 também poderiam se inscrever na plataforma criada para o efeito pelo SEF.

“Este procedimento ágil e eficiente de regularização tem como principais destinatários os cidadãos da CPLP que em 2020, 2021 e 2022 manifestaram interesse em vir trabalhar para Portugal, juntando-se a estes aqueles que entretanto foram aos postos consulares para beneficiarem do novo visto, que pode ser um visto para a procura trabalho. É muito importante que aproveitem agora esta oportunidade para efeitos de regularização”, disse aos jornalistas José Luís Carneiro.

Quando a 13 de março, as autoridades portuguesas iniciaram o processo esperavam agilizar 300 mil processos, metade dos quais de cidadãos lusófonos e os restantes dos imigrantes de outras nacionalidades residentes em Portugal. Até hoje, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) diz que somente os imigrantes da lusofonia com Manifestação de Interesse (MI) feita em 2021 a dezembro de 2022 podem solicitar e estão a tratar da Autorização de Residência CPLP. Sobre os restantes imigrantes não há informações atualizadas.

No primeiro mês do arranque do processo, pelo menos 114.131 cidadãos lusófonos fizeram pedidos de Autorização de Residência CPLP, sendo que dessas solicitações o SEF concedeu 93.209 autorizações às pessoas com manifestações de interesse entregues até 31 de dezembro de 2022.

Fabiano Elias é um dos milhares de cidadãos lusófonos que se encontram nessa situação desde o dia 13 de março e que vão vivendo numa ansiedade tal que qualquer informação que lhes chega aos ouvidos serve para esclarecer o adensar algumas dúvidas instaladas.

A brasileira Brenda Rodrigues dos Santos é bombeira em Portugal e decidiu aderir ao processo de solicitação da nova autorização de residência automática CPLP. Hoje está numa incógnita.

Brenda Rodrigues dos Santos vive em Portugal desde 2021 e sua manifestação de interesse junto ao SEF foi feita em janeiro de 2022 quando trabalhava na CUF Tejo como auxiliar de ação médica com um contrato de trabalho.

“Aos 28 anos de idade e no meio de junho de 2022 entrei no Corpo de Bombeiros de Beato e Penha de França em Lisboa para exercer minha carreira como bombeira estagiária. Dentro do quartel [a direção] me abriu portas para cursos e subir a categoria”, mas nada aconteceu como previsto. A imigrante viu-se tramada ao ter solicitado a residência automática da CPLP, segundo explica numa carta enviada o gabinete jurídico do Alto Comissariado das Migrações.

“No dia 14 de março de 2023, no meu ambiente de trabalho, dei entrada na CPLP que até hoje se encontra em análise e não sei mais o que fazer, pois não consigo pedir minha transferência de quartel para Setúbal porque não tenho a residência. [Hoje] já não estou a trabalhar em Lisboa porque me mudei para Setúbal e ninguém consegue me ajudar. Já estive no quartel de Setúbal para [formalizar o processo d]a minha transferência e o que me falta é a residência porque sem a residência não me transferem. E o pior de tudo é que tenho número fixo de utente, médica de família entre outros benefícios que só poderia ter se tivesse residência, mas ninguém me explica o porquê de não resolvem a tal residência”, lê-se no documento a que o jornal É@GORA teve acesso.

A brasileira Sônia Gomes decidiu por isso lançar um grito de protesto. Em representação de um grupo de cidadãos lusófonos, denominado Movimento Imigrantes Portugal, Sônia Gomes apela à intervenção dos governantes portugueses, sobretudo, o ministro da Administração Interna, José Carneiro, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, e a ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes.

“Em nome do movimento de imigrantes em Portugal, venho através dessa solicitar uma atenção maior da vossa parte à respeito de milhares de imigrantes que estão sofrendo uma desigualdade e injustiças por falta de ordem nas autorizações de residências da CPLP, na qual os mesmos estão barrados no sistema”.

Segundo Sônia Gomes, estes imigrantes são pais e mães “que necessitam sustentar suas famílias” e que “por falta de uma solução da parte dos senhores [ministros] estão a perder os seus empregos, uma vez que perderam suas manifestações de interesse” no SEF ao aderir ao novo sistema de residência CPLP.

De acordo com o documento a que o jornal É@GORA teve acesso, “essas pessoas estão completamente perdidas e desesperadas, merecendo assim uma maior atenção da parte dos senhores [ministros], pois nessa multidão vão encontrar pessoas que inclusive servem ao país não só com seus contributos, como também por amor e dedicação a uma profissão, como é o caso de uma senhora que presta serviços em um quartel de bombeiros na grande Lisboa”, diz Sônia Gomes na carta em que descreve uma “prática [que] chega a ser desumana”.

“Existem pais de famílias em estado de depressão, pois sem documentos sabem que é impossível prosseguir com dignidade, ressaltando também a importância que não é justo passarem à frente [os imigrantes com MI feitas em] 2023 como tem acontecido por um erro de sistema no qual pedimos encarecidamente que seja revisto. Senhores [ministros], essa situação na prática chega a ser desumana, pois foi prometida uma casa para [tratar da regularização dos imigrantes] ser resolvida pessoalmente após se passar pelo sistema automático [debalde, por isso], reivindicamos, por favor, um atendimento pessoal para todos os que se interessam em legalizar-se com ajuda de profissionais e que possam receber explicações por motivos individuais do país que escolheram para viver pagando assim os seus impostos”, apela o Movimento Imigrantes Portugal na carta.

Em breve, os imigrantes admitem realizar uma manifestação. (MM)

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